O que é o Natal pra você?
Por Alessandra Leles Rocha
Há menos de um mês para o Natal me pergunto se realmente a humanidade consegue entender essa data além da superficialidade festiva das decorações. Natal é antes de tudo o aniversário de Cristo; mas, para quem já se acostumou a entrar “de penetra” em tantas festas sem ao menos conhecer o aniversariante, não reverenciá-lo de forma especial e merecida parece plenamente normal nos dias de hoje. Mas, não é!
Independente se Cristãos ou não, muito além da significância de Jesus Nazareno enquanto figura histórica e representativa no contexto sociológico da humanidade, o Natal resgata a reflexão dos valores humanitários sob a ótica individual e coletiva. Não se trata meramente de um momento religioso, de um ato de fé professado por um grupo de pessoas que acredita e reverencia a cristandade. Após onze meses de intenso trabalho e atividade, dezembro se abre para a profícua oportunidade de extrair de nossas almas sentimentos tais como a comunhão, a fraternidade, a união, a caridade, a esperança, a fé, o amor ao próximo; certamente lições ensinadas por Cristo, mas não somente por ele. Nem todos serão de fato arrebatados por essa atmosfera acolhedora, seja em que mês do ano for, mas é o que paira no ar sobre todos nós, independente de nossa vontade! A receptividade, a abertura interior, o despojamento, isso virá da essência que cada um reserva em si mesmo. E no âmbito dessa dependência da vontade individual de evoluir, em se tornar um ser humano melhor, é que o Natal parece a cada ano mais distante do seu verdadeiro valor.
Papai Noel, o bom velhinho, garoto propaganda do marketing consumista da ocasião; creio que até mesmo ele encontra-se descrente diante de tão atroz realidade. As novas gerações não respiram mais a ingenuidade do seu encanto e nem se contentam mais com presentes simples; as cartinhas não são mais escritas à mão, nada de sapatinhos na janela, ninguém espera a chegada dele, pois os presentes (comprados com antecedência) já estão sob a árvore. É preciso novidades high tech para “não ficar por baixo” entre os amiguinhos da escola ou do bairro, as quais, no fundo, eles desde cedo já aprenderam que não vêm trazidas pelo trenó mágico, mas pelas mãos de papais e mamães que foram ao shopping.
Entre bolas coloridas e muito festão verde esperança, assistimos através da imprensa ao massacre da guerra urbana no Rio de Janeiro, aos mísseis disparados contra a Coreia do Sul pela Coreia do Norte, a total apatia na reconstrução do Haiti após o terremoto levando milhares de pessoas a morrerem de cólera pela ausência de saneamento básico, o descaso com a saúde pública em nosso país,... onde estará de fato o espírito do Natal? Seres humanos versus seres humanos, nem mesmo entre seus próprios pares lateja o instinto de preservação da própria espécie! Acima da vida, da sobrevivência, do ser humano, está o poder mascarado por diversas feições: dinheiro, influência, ambição, manipulação, controle, superioridade... onde os fins justificam todos os meios.
Então, comemoraremos o quê? A desordem, o retrocesso, a inversão dos valores? O que nos adianta uma mesa farta e uma alma vazia? O que nos adiantam presentes diversos se não somos capazes de sermos humanos? Estamos comemorando, não apenas no Natal, mas diariamente, a falência de nossa própria existência. Gente de carne e osso, que perdeu a noção do que isso significa e prefere se transformar em boneco de neve, sem sentimento, sem emoção.
Um Feliz Natal só pode existir quando há liberdade, igualdade e fraternidade entre as pessoas, quando o diálogo consegue aparar as arestas, quando o preconceito cede espaço ao conhecimento e a aceitação das diferenças como molas propulsoras ao desenvolvimento e ao sucesso, quando o “EU” só se sente inteiro na presença do “NÓS”. Sem barreiras, sem fronteiras, sem guias, munidos somente da melhor energia que habita em nós alcançaremos sem dúvida o presente de desfrutar um Feliz Natal. Ao desejar um Feliz Natal, um Feliz Ano Novo, que seu desejo venha de fato embrulhado nas mais profundas convicções do que isso significa; ou seja, feliz, isento de infelicidade, de lamúria, de pesar, de tristeza. Que essa felicidade verta de dentro para fora da sua alma e banhe o seu redor, fruto da transformação perene e individual de cada um de nós. Que não sintamos mais vergonha da felicidade de nutrir os bons e melhores valores e sentimentos; mas, tenhamos profundo constrangimento por todos aqueles que são desprezíveis e que estão aniquilando o nosso planeta, a nossa casa, a nossa espécie.