Precisamos
falar sobre isso...
Por
Alessandra Leles Rocha
Já passou da hora de o brasileiro
entender que o aparelhamento do Estado reflete todas as más intenções que
sustentam o acobertamento da ineficiência e demais “mal feitos” que se possa realizar. Trata-se da legitimação das aparências, do
fingir que faz alguma coisa, quando, na verdade, não é nada disso.
Como diz o provérbio, “Cada macaco no seu galho”. Por mais que
se tenha boa vontade e interesse em realizar, determinadas funções demandam competência
e habilidade técnica específica para lograr êxito nos resultados. Colocar alguém
só para fazer figuração, não adianta!
O pior que essa antiga práxis se
institucionalizou de tal forma que acaba passando despercebida pela população,
como se tivesse adquirido um status de normalidade, o qual jamais deveria
existir.
Porque isso é demasiadamente
constrangedor para um país que escancara as suas fragilidades no mercado de
trabalho, começando pelas cifras astronômicas do desemprego.
Ora, nem todos os desempregados e
desalentados nesse país são necessariamente desqualificados profissionalmente. Não.
Tem muita gente, por aí, com habilitações diversas e até mesmo, cursos de Pós-Graduação,
correndo atrás de uma oportunidade. No entanto, para dar vazão ao empreguismo
do aparelhamento estatal, eles acabam preteridos e à margem do mercado.
Infelizmente, até mesmo a
ferramenta dos concursos para seleção de funcionários, entra na roda da
suspeição. Quantos não foram os editais impugnados. As provas canceladas de
última hora, sem quaisquer respeito aos candidatos. As taxas não devolvidas. Os
resultados questionáveis. Os recursos indeferidos sem quaisquer cerimônias. Enfim...
Por isso, é triste que haja
tamanha inconsciência e anticidadania no país. Tanto em relação aos que “normalizaram” essa situação, quanto aos
que se sujeitam protagonizar esse aparelhamento. Porque tudo isso reflete o
nosso ranço colonial. A prática do empreguismo veio desse recorte da história.
Apelando para a vaidade humana,
ou para uma eventual necessidade financeira, o indivíduo se rendia, de bom
grado, à oferta de um cargo público. E para tal, se sujeitava a qualquer
salário.
Mas, geralmente, tratava-se de um
cargo de chefia para que fosse possível lustrar-lhe o ego; mas, também,
imputar-lhe o cabresto da obediência e da subserviência em relação àquele que
se lembrou do seu nome para indicação.
E os exemplos começam nos altos escalões
da República, quando os interesses políticos priorizam a escolha de Ministros,
Secretários, Assessores, Conselheiros, ...
A grande maioria dessas pessoas
simplesmente caem de paraquedas dentro das engrenagens burocráticas nacionais. Elas
não têm a menor ideia por onde começar seu trabalho e, por isso, seguem os
ditames dos interesses de quem os indicou.
Hoje, depois de desvendadas as relações
promíscuas que se estabelecem entre o público e o privado no país, a práxis não
se faz mais restrita aos meandros governamentais.
O empreguismo alçou voos dentro
do mercado de trabalho; embora, não tenha perdido sua essência e valores
tradicionais. O que em suma continua não refletindo qualquer qualidade na
prestação dos serviços.
Por isso, quando o cidadão
reclama, e quase sempre com muita razão, da má qualidade do atendimento, um dos
componentes que se destaca é justamente o fato de que pessoas estão ali no
exercício de funções para as quais não poderiam estar.
E como elas têm consciência disso,
o mecanismo que encontram para se blindar é a apropriação de um comportamento
arrogante e repleto de pseudopoderes.
Algo que fica claramente visível
na recorrente postergação dos serviços, das respostas, das soluções. Na medida
em que eles não estão aptos para cumprir as suas obrigações, o modo que encontram
é buscar servidores que possam de fato resolver.
É justamente aí, que a teia da morosidade
das atividades laborais começa a ser tecida, porque passa a existir uma
sobrecarga de trabalho para certos servidores.
Não é raro que, vez por outra,
certos setores apresentem insuficiência de funcionários. As imposições advindas
do aparelhamento acabam adoecendo e afastando o trabalhador pela excessiva demanda.
O que gera vários ônus para o próprio empregador; sobretudo, a paralisia
funcional em diversas áreas.
Acontece que esse processo
resulta diretamente em um gigantesco obstáculo para o desenvolvimento do país. O
aparelhamento contribui para a baixa competitividade do mercado nacional,
porque perde-se na agilidade, na qualidade, na eficiência. Em muitos setores,
apesar de haver um excesso de funcionários, isso não se reflete em uma melhor
capacidade produtiva.
E a conta disso quem paga é o próprio
cidadão! A conivência com as distorções éticas e morais presentes no país,
desde a sua gênese, custa caro. Justificá-las como “jeitinho brasileiro”, como parte da identidade nacional, não
contribui em nada! Muito pelo contrário. Permanecemos patinando no nosso possível
desenvolvimento, no nosso protagonismo no cenário mundial.
Portanto, mais do que nunca essa
reflexão é oportuna. Estamos em ano eleitoral. Estamos em ano de escolha, não
apenas de pessoas, de representes; mas, de práxis, de projetos, de valores, que
objetivem o desenvolvimento e o realinhamento do país no campo internacional. O
aparelhamento é uma solução imediatista que só repercute o atraso nacional,
nada mais.
Além de ser constrangedor,
triste, lamentável, alarmante, desolador. Mas, precisamos urgentemente falar
sobre isso. O trabalho deve estar a serviço do país e das instituições, não de
governos ou pessoas.
Afinal, o aparelhamento com o seu
empreguismo faz transpirar a corrupção, o descaso profundo com a nação, a ruptura
com a lisura, com a responsabilidade. Como se o Brasil só pudesse ser assim,
enviesado, maculado, deteriorado, incapaz de permitir qualquer vislumbre de decência,
de dignidade e de cidadania.