E
quem são os culpados, hein???
Por
Alessandra Leles Rocha
A vontade é dormir e só acordar
daqui 100 anos, porque os problemas brasileiros estão longe de ser “culpa desse ou daquele”; mas, de uma
política deteriorada que enxerga tudo, menos o cidadão. Deve ter muita gente
decepcionada e frustrada por aí, depois que a toque de caixa, a Câmara dos
Deputados votou o projeto que flexibiliza a Lei de Improbidade Administrativa;
que nada mais é do que qualquer ato ilegal ou contrário aos princípios da
Administração Pública, cometido por agente público, durante o exercício da
função ou decorrente dela.
Aliás, essa pressa com que o
Congresso Nacional tem votado inúmeros projetos chega a ser constrangedor; pois,
como diz o provérbio, “A pressa é a
inimiga da perfeição”. Não é à toa que os assuntos no legislativo federal
brasileiro transitam de maneira requentada, como foi recentemente com a Reforma
Eleitoral, em 2017, que passados quase quatro anos, voltou à cena com novas
propostas este ano. De modo que todo esse movimento transmite a nítida
impressão de um descaso flagrante com a verdadeira realidade do país.
Quando não estão legislando em
causa própria, defendendo interesses nada ortodoxos, um grupo expressivo de
políticos brasileiros, distribuídos pelos 26 Estados e o Distrito Federal, se
abstêm do seu efetivo compromisso constitucional para com o seu eleitor e todos
os demais cidadãos brasileiros. Trata-se de uma relação estranha, na qual se o
político dá algo de bom com uma das mãos, imediatamente, ele retira algo de bom
com a outra mão, deixando a população em um eterno “zero a zero”, que não lhe permite avançar na solução das suas
mazelas e, nem tampouco, na consolidação da sua dignidade.
Mas, eis que, de repente, se
descobre que “não são os políticos os que
governam o mundo. Os lugares de poder, além de serem supranacionais,
multinacionais, são invisíveis” (José Saramago – Expresso 1, 1993). Antes que a boa ou a má-fé de
uns e outros seja depositada na urna eleitoral, grupos seletos de gente
importante e rica faz as campanhas dos candidatos, investindo seu tempo e
recursos, em troca do poder de delinear as pautas e os caminhos políticos que
deverão ser seguidos em caso de êxito. E como foi fácil perceber tudo isso,
durante esses quase dois anos de Pandemia.
A luta foi inglória porque
estávamos em total desvantagem. 3 contra 1, ou seja, o Sars-Cov-2, o Poder
Executivo, o Poder Legislativo e o povo. Porque se assim não fosse, não
estaríamos mergulhados no caos, dessa maneira tão sórdida e cruel. Verdade seja
dita, não houve quem estivesse realmente ao nosso lado, lutando a nosso favor
do ponto de vista da manutenção do equilíbrio do país.
Como nas arenas romanas estamos
entregues às feras, à própria sorte ou à falta dela. Porque enquanto o tempo
urge nas calamidades e sofrimentos da vida brasileira, eles estão sempre
deliberando, discutindo, fazendo alianças, moldando conchavos, gastando tempo e
cafezinhos, esperando a semana que vem, o mês que vem, o ano que vem, e
construindo narrativas retóricas fantásticas.
Muito tem se falado dos “paralelismos” que permeiam a realidade
política nacional e é verdade. Não só de mundo real e virtual vive o Brasil.
Ele próprio está dividido entre dois modos de vê-lo e entendê-lo, consolidados
sob duas perspectivas de interesse, uma individual e outra coletiva. Em uma, o
país cresce em V e supera as expectativas mundiais, é um verdadeiro fenômeno.
Em outra, ele está desafiado a enfrentar a combinação entre a estagnação do
crescimento econômico, o desemprego e a inflação alta generalizada sobre bens e
serviços. Mundos que, segundo a geometria euclidiana, não tem como se encontrar,
porque não tem nenhum ponto em comum.
Enquanto alguns se digladiam por
uma eleição presidencial projetada no futuro de 2022 e outros discutem sem
consenso sobre uma tal “3ª via” para o cargo mais importante do país, é
espantoso que não se veja quaisquer discussões que alcancem o conjunto político
nacional, o qual irá preencher as cadeiras do Legislativo Federal, Estadual e
Distrital e, talvez, sejam até convidados a ocupar secretarias e ministérios
nas novas gestões.
É como se todo o cenário político
nacional se resumisse ao topo da pirâmide, tornando essa discussão a única
prioridade, quando, na verdade, não é. Embora esta seja uma República
Federativa Presidencialista, nem o chefe do Executivo Federal, o Presidente da
República, e nem os chefes dos Executivos Estaduais, os Governadores de Estado,
são capazes de realizar o seu papel constitucional sem o apoio das casas
Legislativas. Tendo em vista que os deputados federais, estaduais e distritais
e os senadores são em maior número, dada a distribuição político-partidária, a
importância deles está longe de poder ser esquecida ou negligenciada.
Uma pena que, “A política é talvez a única profissão para
a qual se pensa que não é preciso nenhuma preparação” (Robert Stevenson –
escritor escocês). Porque é desse senso que emerge o absurdo de pensar que se
pode negligenciá-la, como se não houvesse quaisquer consequências ou
desdobramentos nefastos disso. O problema é que há. Mas, como fizeram disso uma
teia na qual “A política foi primeiro a
arte de impedir as pessoas de se intrometerem naquilo que lhes diz respeito. Em
época posterior, acrescentaram-lhe a arte de forçar as pessoas a decidir sobre
o que não entendem” (Paul Valéry – poeta/ensaísta/crítico francês), mais e
mais pessoas sentiram-se convidadas a não se envolver nem direta e nem
indiretamente.
Por isso, cada vez mais é
imperioso ao cidadão brasileiro compreender a seguinte realidade, “Sem política não se organiza uma sociedade.
O problema é que a sociedade está nas mãos de políticos profissionais” (José
Saramago – Jornal do Brasil, 1994). E eles não estão só dentro do cenário
político convencional de Brasília. Estão por aí, distribuídos em secretarias,
departamentos, autarquias, ..., dos primeiros aos últimos escalões da
administração pública, em razão das alianças políticas vigentes.
De modo que diante dessa
profissionalização que levou à consolidação de tantas polarizações pelo país, é
preciso know-how, expertise, na hora do eleitor fazer
escolhas, de elencar prioridades. Afinal de contas, “A guerra política já não é entre a direita e a esquerda – é entre
individualistas e coletivistas. Em entre quem pensa primeiro em si próprio e
quem pensa primeiro nos outros” (Miguel Esteves Cardoso –
crítico/escritor/jornalista português).