Cuidado
na engenharia da linguagem!
Por Alessandra
Leles Rocha
Não se engane, distorcer a
palavra alheia para alcançar um determinado fim, sempre fez parte da história! No
entanto, em plena era Digital, o que precisava da ajuda do velho boca a boca,
agora, basta apenas um toque na tela para correr o mundo, na velocidade da luz.
Talvez, por isso, antevendo o futuro, os chineses tenham se antecipado ao
cunhar o seguinte provérbio: “A palavra é prata, o silêncio é ouro”.
Vamos e convenhamos que a
radicalização e o extremismo contemporâneo da ultradireita têm sim, se valido
dessa práxis para colher frutos, em relação à sua empreitada de dominação global.
Ciente de que os ânimos andam acirrados e que a tensão paira sobre os quatro cantos
do planeta, ela faz da linguagem uma ferramenta imprescindível para sua beligerância.
Adeptos e simpatizantes dessa
corrente político-partidária aproveitam qualquer palavra para distorcer,
manipular, enviesar, a fim de abalar a credibilidade de seus opositores. O recente
episódio envolvendo o sistema de pagamento PIX, no Brasil, é prova disso. Antes
que a ideia estivesse prontamente formulada e estruturada, elementos da
ultradireita se apropriaram de palavras para construir o caos.
Em outros tempos, não sei se por
instinto ou por sabedoria, as pessoas exerciam uma prudência maior em relação à
fala. Dedicava-se maior atenção ao que se ouvia, para depois expressar alguma
manifestação. Atualmente, tudo acompanha o ritmo frenético da contemporaneidade,
como se o mundo fosse acabar em segundos! Mas, não é só isso. A necessidade de
se fazer presente nos debates e discussões; sobretudo, em razão do espaço
virtual, tornou a verborragia um fenômeno incontrolável.
Como disse Umberto Eco ao jornal La
Stampa, “As redes sociais dão o direito de falar a uma legião de idiotas que
antes só falavam em um bar depois de uma taça de vinho, sem prejudicar a
humanidade. Então, eram rapidamente silenciados, mas, agora, têm o mesmo
direito de falar que um prêmio Nobel. É a invasão dos imbecis”. E a maioria
dessas pessoas se dispõe a servir nas trincheiras da mentira em troca de algum
benefício ou interesse particular.
Bem, considerando que o silêncio
se transformou, praticamente, em uma exceção contemporânea, façamos dele a ferramenta
do sucesso! Não importa em que situação da vida, o importante é reconhecer o
momento certo para nos manifestar. Somente dessa maneira é possível evitar às
investidas da distorção, manipulação ou enviesamento discursivo. Silenciar, nesse
caso, não é omissão, não é negligência, não é descaso. É, simplesmente, precaução!
Afinal, o objetivo maior da
linguagem é se fazer entender. Nesse sentido, “A língua envolve todas as
ações e pensamentos humanos e possibilita ao indivíduo exercer influências ou
ser influenciado pelo outro, desempenhar seu papel social na sociedade,
relacionar-se com os demais, participar na construção de conhecimentos e da
cultura, enfim, permite-lhe se constituir como ser social, político e
ideológico”. (COELHO; MESQUITA, 2013, p. 26 1).
Por isso, não se pode cair na tentação de falar sem pensar, deixando
brechas de todo tipo, para bom uso de quem gosta de um malfeito.
Assim, apesar do imenso desconforto
e risco trazido pelas Fake News, sua grande contribuição advém do fato de nos
fazer entender que “a palavra penetra literalmente em todas as relações
entre indivíduos, nas relações de colaboração, nas de base ideológica, nos
encontros fortuitos da vida cotidiana, nas relações de caráter político, etc.
As palavras são tecidas a partir de uma multidão de fios ideológicos e servem
de trama a todas as relações sociais em todos os domínios. É portanto claro que
a palavra será sempre o indicador mais sensível de todas as transformações
sociais, mesmo daquelas que apenas despontam, que ainda não tomaram forma, que
ainda não abriram caminho para sistemas ideológicos estruturados e bem
formados” (Bakhtin, 1997, p.41 apud COELHO; MESQUITA, 2013, p. 33). De modo
que a palavra é o fiel da balança, seja para o bem ou para o mal.
1 COELHO, L. P.; MESQUITA, D. P. C. de. Língua, Cultura e Identidade: Conceitos intrínsecos e interdependentes. ENTRELETRAS, Araguaína/TO, v.4, n.1, p.24-34, jan./jul.2013.