segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

A judicialização da vida em tempos tecnologizados

A judicialização da vida em tempos tecnologizados

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Vivemos tempos em que o distanciamento dos valores éticos e morais na sociedade acaba por estabelecer novos caminhos para as mediações e as soluções de conflitos. Pois é, estamos em um tempo no qual a vida, na dinâmica do seu cotidiano, precisa ser judicializada, o tempo todo.

Acontece que para fazer valer os direitos, nesse contexto, o cidadão é levado a sentir na pele o desânimo causado pela morosidade judicial e as consequências de uma Justiça abarrotada de processos, os quais muitos não precisariam existir se a conduta humana fosse mais responsável. É assim, ou sofrer calado a injustiça!

E pensando a respeito, eis que ao expandir meu olhar sobre o mundo contemporâneo, me deparei com uma situação que tem tudo para dar um verdadeiro nó na judicialização.  Até aqui, não vejo que a humanidade venha se preparando e/ou se atentando para os desafios sociais que a Inteligência Artificial (I.A.) irá impor no campo jurídico.

Na medida em que a tecnologização do mundo deu saltos de inovação gigantescos, já começamos a experimentar problemas sérios, em questões de criminalidade. Ao ponto de as Ciências Jurídicas precisarem se debruçar sobre os vieses dessa temática e serem criadas delegacias e promotorias especializadas nos chamados Crimes Cibernéticos. Uma resposta importantíssima para aqueles que acreditavam que o mundo virtual é “terra de ninguém”.

Porém, o mundo não para e as Tecnologias da Comunicação e da Informação (TICs), também, não. E o ponto alto, do momento, é a Inteligência Artificial (IA), ou seja, uma área da ciência da informática destinada a criar programas e mecanismos capazes de exibir comportamentos tidos como inteligentes. Na verdade, a I.A. utiliza de algoritmos e de um conjunto de técnicas de aprendizado de máquina para análise de dados, tomada de decisões e resolução de problemas.

E com toda essa expertise, infelizmente, ela pode ser usada em benefício ou malefício da sociedade, em geral.  Basta a existência de interesses escusos, para que através da I.A. seja feita a manipulação ou adulteração de fotos, vídeos, sons e/ou documentos, a fim de causar constrangimento, humilhação, assédio, ameaça ou qualquer outro tipo de violência. O que pode levar a certas consequências irreparáveis, como o suicídio de uma vítima.

Mas a questão não para por aí. O Brasil, por exemplo, ainda não dispõe de uma legislação reguladora para o assunto. Enquanto isso, o tempo urge! Porque não se trata de qualquer legislação, tendo em vista que a I.A. funciona como antídoto de si mesma. Ora, medidas como a autenticação por voz ou a validação de imagem em tempo real se tornam ineficientes. Daí as ações criminosas, utilizando a I.A., se tornarem um gigantesco problema de judicialização no país.

Sem legislação sobre o assunto e sem um conjunto de ferramentas tecnológicas para distinguir a veracidade dos materiais comprobatórios, o judiciário demandará muito mais tempo para dar uma resposta aos que ingressarão com ações de reparação por crimes cometidos através da I.A., no país. O que fará a sensação de impunidade recrudescer dentro da sociedade. Será a conquista do caos.

Por isso, é preciso que o assunto seja pauta de ampla discussão, o mais rápido possível. Sem qualquer controle e/ou fiscalização, a I.A. pode tomar a sociedade brasileira de assalto e promover o seu fracasso civilizatório, em um piscar de olhos. Essa é uma grave ameaça não só à Democracia e ao Estado de Direito; mas, à sobrevivência de cada cidadão que possa ser vítima das violências delituosas de origem tecnológica. Qualquer um pode ser a bola da vez desse contexto de insegurança e ódio que se dissemina entre nós.