Sobre
o mundo, nós e nossas responsabilidades socioambientais
Por
Alessandra Leles Rocha
Temos que admitir que os posicionamentos
político-ideológicos das autoridades, em relação às questões socioambientais, andam
mesmo frustrando as expectativas. Mas, não deveria? Afinal, essas pessoas são
emergidas da escolha representativa feita pela própria população, ou seja, um
espelho de crenças, valores, convicções e princípios dos eleitores. Pois é, me desculpe
se estou sendo franca demais; mas, essa observação é muito importante.
Ora, há tempos, que costumo comentar
nos meus textos a respeito do efeito manada, tão presente na contemporaneidade.
Acontece que por trás desse comodismo conveniente que ele promove, tendo em
vista que os indivíduos acabam se abstendo de pensar com a própria cabeça para
seguir a opinião, ou os movimentos, de certos grupos, de maneira irracional e
totalmente desprovido de análise e criticidade, o efeito manada se torna o
álibi perfeito para justificar uma alienação irresponsável quanto às escolhas e
às decisões tomadas pelos indivíduos.
O curioso é que, de repente, se
percebe como isso, facilmente, desabrocha no fenômeno do negacionismo. As
expressões da negação contemporânea não vêm fundamentadas por argumentos contundentes
e acima de quaisquer contestações. Não, eles nascem dos achismos e casuísmos proliferados
aos milhões pelas mídias sociais, sem quaisquer compromissos com a verdade
factual; mas, imbuídos de manipular determinados grupos para controlá-los pela
fome de consumo dessas notícias sensacionalistas, enquanto as Big Techs monetizam através desse
processo.
No fundo, para desconstruir a
imagem pejorativa que reveste o efeito manada, o negacionismo surge como
ferramenta para empoderar as pessoas quanto à sua liberdade e autonomia. Um
risco grande, na medida em que põe em xeque limites éticos, morais e jurídicos,
porque cria uma falsa sensação de poder. Muitos passam a acreditar que a dinâmica
da sua vida pode se dar, única e exclusivamente, por suas próprias perspectivas.
Que eles não precisam respeitar quaisquer limites ou protocolos sociais
vigentes.
Tomando como exemplo a
dificuldade encontrada pelo governo brasileiro em reestabelecer os parâmetros de
vacinação no país, que vem sendo totalmente desconstruídos pelas manifestações
negacionistas, não me parece incompreensível que eventuais ações em favor do
Meio Ambiente sejam ainda mais complicadas de alcançar bons resultados,
considerando as próprias complexidades naturais do assunto.
Talvez, por isso, haja um certo
arrefecimento por parte dos gestores públicos, em se mostrar afeitos às
desconstruções paradigmáticas e aos novos alinhamentos socioambientais impostos
pela dinâmica contemporânea. Afinal, depois de três séculos vivendo sob a
batuta desse modelo de produção e consumo é difícil lançar mão dessas pseudo
zonas de conforto!
Um bom exemplo a esse respeito
está na substituição dos combustíveis fósseis por matrizes energéticas limpas. Ainda
há quem defenda resistir, até que haja a exaustão desses recursos, para só, então,
promover a substituição. Desconsiderando por completo os impactos que
resultariam da ausência de um planejamento estratégico para esse rito de
passagem. Sem contar que o maior inimigo para essa dialogia é o capital. O potencial
econômico que foi alavancado a partir desse modelo de produção e consumo vigente,
é sem dúvida um entrave significativo para o surgimento de uma nova ordem para
as relações socioambientais.
Simplesmente, porque os efeitos
psicocomportamentais advindos disso foram tão brutais e selvagens que a
humanidade padece uma constante crise de abstinência, fomentada principalmente
pelas mídias sociais, que se tornaram as grandes vitrines propagandistas no
mundo contemporâneo.
Do essencial ao supérfluo, do analógico
ao digital, as indústrias estão cada vez mais compelidas a não parar de
produzir novidades. Enquanto milhões de pessoas aguardam ansiosas pelas gotas
de dopamina aspergidas pelo consumo frenético desses produtos, os quais, na
maioria das vezes, elas nem se dão conta do motivo pelo qual estão comprando. Aliás,
pode-se dizer que esse é mais um efeito colateral da negação alienante.
Esse movimento convulsionado de
produção e aquisição está modulado para invisibilizar quaisquer efeitos socioambientais
nocivos e/ou deletérios. Ninguém se preocupa com a produção de resíduos sólidos
(lixo) e/ou de efluentes químicos, com o aumento exponencial do consumo energético,
com o uso indiscriminado de recursos hídricos, enfim... O que importa é a geração
de riquezas para os donos dos meios de produção, os banqueiros, o Estado e a
quem mais possa interessar. O que importa é ver as pessoas sob um regime de
consumo servil, que lhes afasta da possibilidade de enxergar a vida como
realmente ela é.
Bem, enquanto for esta a lógica a
imperar, os posicionamentos político-ideológicos das autoridades e gestores tendem
a funcionar entre idas e vindas de passos à frente e passos atrás. Mas, onde
está escrito que a população precisa aguardar por essas pessoas para promover
mudanças, hein? Hora de abandonar a manada e defender o instinto de sobrevivência!
Já dizia Umberto Eco, “Justificar tragédias como ‘vontade divina’
tira da gente a responsabilidade por nossas escolhas”. Bem, pelo menos em
tese. Sim, porque o dedo que você aponta para as irresponsabilidades político-ideológicas
de uns e outros, também aponta para você, quando escolhe certas pessoas, ou
ideias, ou atitudes, para representá-lo (a), dentro de um acordo tácito que
quase sempre não se preocupa com os desdobramentos e consequências futuras.
Desse modo, se você acaba de descobrir que está tudo errado, que não é bem assim, que é preciso mudar, comece a transformar pequenos hábitos do cotidiano, para que grandes mudanças comecem a ser sentidas. Segundo Mahatma Gandhi, “Você nunca sabe que resultados virão da sua ação. Mas se você não fizer nada, não existirão resultados”.