sábado, 10 de junho de 2023

Aparências... Evolução...


Aparências... Evolução...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Nada mais contemporâneo do que o provérbio “Por fora bela viola, por dentro pão bolorento”. A mesma sociedade que ostenta e se vangloria das parafernálias high tech traz dentro de si um ranço de deformidades éticas e morais de tempos longínquos. Um passo à frente e dezenas de outros atrás, provando que enquanto sociedade fracassamos, quando o assunto é romper com as barbáries físicas e comportamentais históricas. E no Brasil não é diferente!

Como já se tornou comum presenciar, essa semana foi repleta de manifestações nesse sentido. Veículos de comunicação e de informação, tradicionais e alternativos, trouxeram ao conhecimento público notícias 1 que reforçam o grau de retrocesso da sociedade brasileira a partir do modo de agir e pensar de suas próprias instituições. O que é muito grave, na medida em que estas têm no seu rol de papéis uma função balizadora para o coletivo.  

De modo que, todas as vezes, em que as instituições silenciam às diversas faces da violência, elas automaticamente referendam tais práticas. O que na maioria das vezes faz reverberar a dor, o sofrimento, o constrangimento, a humilhação e a injustiça entre toda a sociedade; mas, especialmente, pela própria vítima. Aliás, o nosso passado colonial é mestre nisso! Sua capacidade de culpabilizar o injustiçado, tomando por base certos critérios de importância socioeconômica, é que permite ao país insistir nas suas práxis racistas, misóginas, homofóbicas, xenofóbicas, aporofóbicas, ...

E desse movimento absurdo, começo a entender, então, que o Brasil vive, de fato, uma evolução de fachada. O que ajuda muito a entender porque razão o país se arrasta nas suas tentativas de desenvolvimento e de progresso. Já dizia Oscar Wilde que “O descontentamento é o primeiro passo na evolução de um homem ou de uma nação”. Há pouco mais de 500 anos, o Brasil transita pelas mesmas ideias, valores, princípios e convicções, como se estivesse tudo bem. Só que não.

A começar pelo fato de que o mundo de 500 anos atrás não é o mesmo. As relações sociais, políticas e econômicas são outras. Sendo que muitas decorrem de um intenso processo de ruptura e desconstrução paradigmática a fim de caber nas atuais demandas e imposições conjunturais contemporâneas. Pois é, muita água rolou por debaixo dessa ponte! Só o (a) brasileiro (a) não viu ou, simplesmente, optou por não ver.

Parece fácil para quem descende de o topo da pirâmide social brasileira trivializar a indignidade humana, na medida em que se criou, no curso da história, uma legitimidade discursiva em torno da desigualdade social. Inclusive, é fundamental destacar que a desigualdade não se resume à renda, ao poder aquisitivo. Não, ela abarca uma abstração em torno do estabelecimento de pessoas, cuja cidadania pode ou não ser exercida plenamente.

Assim, em pleno século XXI, mulheres, negros, povos originários, pessoas com deficiência, pessoas de baixa renda, idosos e população LGBTQIA+, são alvos preferenciais das mais diferentes formas de violência, no país. De violências que encontram nos silêncios sociais e institucionais os seus grandes aliados para permanecerem reverberando o retrógrado dentro do contemporâneo.

Na verdade, esses silêncios são formas utilizadas pelas elites dominantes para exercitar os seus pequenos poderes, ou seja, elas exacerbam, autoritária e absolutamente, os poderes que têm nas mãos, criando uma verdade modulada segundo suas perspectivas. O que acaba se traduzindo em uma condescendência velada com aqueles, direta ou indiretamente, ligados a elas. Só se esquecem de que a barbárie do século XXI, não traz a violência pela tomada de territórios; mas, pela amplitude manipuladora das mídias sociais.

Gonzáles Pecotche dizia que “Todo conceito que o homem não modifica com sua evolução, torna-se um preconceito, e os preconceitos acorrentam as almas à rocha da inércia mental e espiritual”. Enquanto a humanidade se entretém nas teias do consumo tecnológico, se exibindo como o ser mais evoluído da galáxia, sua essência se arrasta em terreno rançoso e cada vez mais imóvel no tempo. Quem diria que o salto científico e tecnológico acabasse a serviço do primitivismo humano, não é mesmo?!

Por isso é tão importante pensar o que as mentes brilhantes estão criando em termos de Inteligência Artificial (I.A.). De qual tipo de ideias, valores, princípios e convicções, a I.A. irá se nutrir? Ela será uma aliada do retrocesso histórico ou uma esperança renovada para o futuro? Responder a essas questões significa um caminho importantíssimo para o entendimento de que “A história humana é o resultado do conflito dos nossos ideais com as realidades, e a acomodação entre os ideais e as realidades determina a evolução peculiar de cada nação” (Lin Yutang). Afinal de contas, pelas aparências não se chega, necessariamente, à evolução.