Sem
rumo...
Por
Alessandra Leles Rocha
Não há como dissociar trajeto e
objetivo final; pois, se você não sabe o resultado que quer alcançar, também,
não saberá que caminhos trilhar para consegui-lo. Olhando com atenção para esse
momento conjuntural brasileiro isso me parece cada vez mais evidente. De modo
que a espiral de problemas gira em uma velocidade assustadora diante de nossos
olhos sem dar sinais de algum motivo de esperança por dias melhores.
Segundo dados da Pnad Contínua (Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios Contínua) conduzida pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) chegamos a 2021 com um percentual
de aproximadamente 14 milhões de desempregados no país. O que representa um
entrave e tanto para o movimento de recuperação e de alavanca para melhoria dos
índices econômicos.
No entanto, o panorama se agrava
significativamente pelo fato de que o auxílio emergencial, pago durante os
meses de abril a dezembro de 2020 por conta da situação de calamidade pandêmica,
foi finalizado. Como não se chegou a uma nova proposta para atender, ao menos, os
mais necessitados dentro do contingente inicial, manteve-se apenas o pagamento
para os Programas Assistenciais já vigentes, como é o caso do Bolsa Família.
Isso significa que a cada intempérie
que surge no horizonte e afeta o campo econômico, a crise social se aprofunda e
ressalta as fronteiras da desigualdade que impactam com severidade o desenvolvimento
e o progresso nacionais. Há uma evidente carência de planejamento para romper
com o ciclo somativo de inação brasileira; haja vista, por exemplo, o fato de que o Produto
Interno Bruto (PIB) cresceu apenas 2,2% entre 2011 a 2020.
O país parece acostumado a viver
de perdas e não apresenta planejamento algum que contrarie esse fenômeno. As
notícias do dia, por exemplo, trazem uma proposta de demissão voluntária de
cerca de 5000 funcionários do Banco do Brasil, com base no fechamento de 361
unidades, o que inclui 112 agências; e, a notícia de que a Ford encerrará a
produção de veículos em suas fábricas fixadas em nosso território. Portanto,
mais desemprego a vista.
É como se toda a construção de autossuficiência
produtiva que se veio galgando, a duras penas, décadas a fio, encolhesse até o
patamar de sermos apenas importadores de manufaturados. No fundo, o Brasil se
satisfaz com a condição colonialista de produtor/exportador de matérias-primas
e produtos agrícolas.
Entretanto, isso não é o
suficiente para atender as demandas de uma população de mais de 212 milhões de
habitantes, cuja grande maioria habita os centros urbanos e não tem nenhuma
relação com esses setores produtivos. A vida dessas pessoas se concentra nas
expectativas oriundas do universo urbanizado do país. Escolas. Universidades.
Tecnologia. ... Enfim.
Por isso a situação é tão grave. Tamanha
indefinição socioeconômica só faz alimentar um caos de proporções inimaginadas
que pode, inclusive, colocar o país em posição de atraso em décadas se
comparado a outras de mesmo porte. Sem planejamento, sem método, capazes de mitigar
a situação atual, o Brasil desconstrói a sua vitrine de competitividade
internacional e se lança na posição de simples comprador de bens, produtos,
tecnologias e serviços; enquanto, simultaneamente, elimina quaisquer
possibilidades de igualdade e equidade na sua pirâmide social.
Todas essas questões me fazem,
então, pensar que José Saramago tinha mesmo razão, quando manifestou que “O egoísmo pessoal, o comodismo, a falta de
generosidade, as pequenas covardias do cotidiano, tudo isso contribui para essa
perniciosa forma de cegueira mental que consiste em estar no mundo e não ver o
mundo, ou só ver dele o que, em cada momento, for susceptível de servir os
nossos interesses”. Veja que nem essa Pandemia foi capaz de produzir um
efeito transformador para essa prática socioeconômica devastadora; pois, “ sente-se uma insatisfação, sobretudo dos
jovens, perante um mundo que já não oferece nada, só vende! ” (José
Saramago).
Desse modo, a continuar a vagar
assim, nos cabe aguardar para descobrir se algum propósito nesse sentido será realmente
alcançado. Porque a verdade é que “sem
futuro, o presente não serve para nada, é como se não existisse. Pode ser que a
humanidade venha a conseguir viver sem olhos; mas, então, deixará de ser humanidade”.
(José Saramago, Ensaio sobre a Cegueira).