quarta-feira, 15 de março de 2017

Para ler e pensar bastante!!!

Fechado para balanço!



Por Alessandra Leles Rocha



TV Digital. Freezer. Máquina de Lavar. Secadora. Cooktop. Wi-Fi. Scanner. Laser. Acelerador Nuclear de Partículas. Ressonância Magnética... e outros tantos elementos que fazem parte do cotidiano de milhões de pessoas ao redor do mundo. Resultados de uma nova ordem de tecnologia e progresso, a qual se denominou Revolução Industrial, que chegou há aproximadamente quatrocentos anos, no contexto de uma promessa de mais tempo, eficiência, produtividade e melhor qualidade de vida. E para muitos o discurso é mesmo esse; uma rendição quase inconsciente aos apelos de um mundo que brilha e gira literalmente à velocidade da luz.
No entanto, longe de querer azedar a boa fé dessas pessoas, a realidade que nos impõe o século XXI, em meio aos discursos populistas, as milhares de propagandas enganosas bradadas aos quatro cantos e recheadas de soluções rápidas para problemas altamente complexos, os impactos da economia, nos faz viajar de volta ao passado e enxergar com outros olhos essa tal Revolução.
Lá na segunda metade do século XVIII, quando se iniciou a transição dos métodos de produção artesanal para as máquinas movidas a vapor, que o mundo selou seu futuro. A riqueza oriunda do mercantilismo de séculos anteriores fomentou a ousadia desse processo e fez surgir às bases da Economia Capitalista Moderna e, consequentemente, a Divisão Social do Trabalho, ou seja, as atribuições produtivas nas estruturas socioeconômicas, de modo que cada indivíduo (ou grupos de indivíduos) possui uma função na hierarquia social, da qual advém a sua importância (ou status) perante a sociedade. 
No entanto, a organização do trabalho nas sociedades urbanas industriais embora tenha estabelecido normas, tais como o tempo de jornada e a remuneração de acordo com a tarefa realizada, não conseguiu romper definitivamente com as sombras seculares da escravização. A indignidade que sempre tomou conta das relações de trabalho escravo permaneceu obscura nas entrelinhas dos discursos sociais, de tal modo que ao longo desses quase quatro séculos a distribuição da riqueza, entre os que produzem e os que detêm os meios de produção, tornou-se mais e mais abissal 1.
Inebriados pela farta oferta de bens e serviços a humanidade acelerou o seu ritmo de vida e de trabalho, mesmo que hoje existam leis específicas no ordenamento dos direitos e deveres laborais. E por mais que se agitem nesse ritmo frenético de busca pela ascensão e dignidade sociais, os trabalhadores se frustram diante dos ínfimos resultados conquistados.
Afinal de contas, o mundo que conheceu o advento da Revolução Industrial cresceu muito em termos de contingente populacional; portanto, a grande oferta de mão de obra impacta diretamente nos salários e na possibilidade de incremento de mais benefícios (plano de saúde, creche, auxílio alimentação etc.). Quanto mais pessoas disputando uma vaga, menor será o valor do salário pago para aquela função; sem contar, na diferença existente entre a remuneração de homens e mulheres, na qual eles ganham mais do que elas.  
Além disso, reflexo da própria industrialização, a mecanização dos meios de produção oferece a possibilidade de substituição da mão de obra convencional humana pelas máquinas. Todos os encargos trabalhistas que incidem sobre o trabalhador passam a inexistir quando a máquina assume a produção. O investimento muitas vezes é alto para adquiri-la; mas, sem ter que arcar com os encargos e a alta rentabilidade da produção, os donos dos meios de produção nem cogitam outra possibilidade.
É por isso que, de certa forma, o envelhecimento populacional, não interfere diretamente na sobrevivência da cadeia de produção; pois muitas empresas, quando aposentam seus funcionários mais antigos ou substituem por funcionários com menores salários ou buscam a mecanização. Não é à toa que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estimou esse ano que a taxa de desemprego no mundo será de 5,8%, o que significa 3,4 milhões de novos desempregados, os quais o Brasil responderá por 35% deles 2.
Como é possível perceber, enquanto a população mundial se deixava encantar pelos feitos “incríveis” da industrialização, ela própria, na condição de trabalhador assalariado, era espoliada nos seus direitos e conquistas. A economia do mundo nunca se preocupou de fato com a qualidade de vida das pessoas, porque com máquinas e mão de obra convencional humana em franca disponibilidade seria fácil substituir.
É por isso que as discussões ao redor do planeta sobre os direitos trabalhistas e previdenciários do cidadão são sempre motivo de embates difíceis, porque o trabalhador no contexto da industrialização sempre esteve na posição de peça dentro do processo. Ele só passou a fazer parte de tudo isso porque outros tomaram decisões que instituíram esses meios de produção; portanto, ele nunca esteve na condição de ditar regras. Mesmo com a criação de Sindicatos e entidades ligadas aos direitos trabalhistas, eles pouco influenciam nas decisões finais. São quase sempre conquistas insignificantes, parceladas a perder de vista, aquém das demandas sociais impostas pela própria economia, traduzidas em salários incapazes de cumprir com a dignificação do cidadão.
O que se vive hoje no Brasil, por exemplo, em relação às questões previdenciárias é o somatório de acumulativas gestões imprevidentes, as quais somos de certo modo responsáveis por existir, com a redução do número de trabalhadores contribuindo. O gargalo gerado por essa deficiência crônica leva ao infeliz quadro de em muito pouco tempo não se poder arcar nem com os benefícios já adquiridos nem com os que virão a ser concedidos. Como consequência desse caos, as relações de trabalho precisam, então, ser repensadas imediatamente. Porque com os encargos trabalhistas mais elevados em um grupo de 25 países analisados, o que representa em média 57,56% do valor bruto do salário em tributos, enquanto a média global é 22,52% 3, o Brasil não só fomenta o desemprego como influencia o surgimento do trabalho informal, o qual além de não resguardar os direitos do trabalhador não contribui com a Previdência Social.
Desse modo, podemos dizer que milhares de desdobramentos não pensados a luz do surgimento da Revolução Industrial, agora, nos assombram dia e noite. O que chegou à revelia de nossa vontade, também nos impõe a obrigação de pensar e encontrar um modo menos indigesto de lidar com os resultados, a começar pela disposição em aceitar que as relações de trabalho precisam se adequar as conjunturas do mundo contemporâneo; sobretudo, por conta do elevado número de desempregados. Nesse contexto é importante considerar também a população jovem que ingressa todos os anos no mercado de trabalho. Em 2016, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estimou que o índice mundial de desempregados jovens, entre 15 e 24 anos, seria de 13,1%, ou seja, um aumento de meio milhão de pessoas, em relação ao ano anterior 4.
Como se vê, a situação a enfrentar é tão complexa quanto trocar um pneu com o carro em movimento. Estamos falando de seres humanos, de dignidade, de sobrevivência, de sonhos, de esperanças; por isso, precisamos compreender sobre o que se trata esse momento e porque chegamos até ele.  Durante séculos, foi disseminado em nosso inconsciente coletivo um discurso sobre as alegrias do consumo, da industrialização, do progresso, para nos motivar a seguir as cegas em busca desse “Eldorado de Bonança e Fartura”; uma nova roupagem do velho discurso Absolutista do “pão e circo”.
Agora chegamos ao limite; pois, tudo na vida tem um limite. Toda grande empreitada pede ajustes, pede planejamento, pede controle. Chegou a hora. Temos que nos reinventar, nos redescobrir em nome da nossa sobrevivência nesse mundo cada vez mais industrializado e tecnológico. E garanto a você, leitor (a), que não será partindo do quebra-quebra, das frases de efeito, dos discursos rotos e remendados que mesmo quando estavam inteiros já não surtiram efeito algum. Se for para buscar no primitivismo que seja como foi na criação da roda, do fogo, das vestimentas de pele de animais; algo inventivo, inteligente, criativo e verdadeiramente capaz de acenar com resultados profícuos. Mesmo assim, talvez a única certeza que possamos ter é a seguinte: perdas irão sempre existir, pois a vida é feita de escolhas, de caminhos e para ganhar há de se perder alguma coisa. Ninguém tem tudo o que deseja.  




1 Os 8 bilionários que têm juntos mais dinheiro que a metade mais pobre do mundo - http://www.bbc.com/portuguese/internacional-38635398


2 Brasil responderá por 35% dos novos desempregados do mundo em 2017 - https://nacoesunidas.org/brasil-respondera-por-35-dos-novos-desempregados-do-mundo-em-2017/

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