terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Já parou para pensar?!



Afinando o discurso


Por Alessandra Leles Rocha


Se há uma coisa que me “cansa” nesse país é a total falta de sintonia no discurso. Não, não é só pela enxurrada de erros graves cometidos contra a língua pátria! Tão pior quanto está no fato da variação explicativa sobre um mesmo assunto, gerando uma terrível confusão mental na tentativa de quem quer compreender.
Há tempos, por exemplo, venho observando os caminhos do mercado de trabalho no país e me perdendo pelos labirintos que o assunto tão habilmente desenvolveu. É! Às vezes dizem que falta mão de obra qualificada e com experiência, outras desconversam que isso não é ponto de discussão, pois o próprio mercado pode capacitar, outras o candidato é qualificado demais (ou de menos), outras atribuem o peso das contratações a total pro atividade do candidato, outras ranqueiam as profissões entre “as do momento” e “as já saturadas”; enfim... Ao estabelecermos esses “senões”, ainda que inconscientemente, estamos sim, ferindo os princípios fundamentais da Constituição de 1988, previstos no artigo 3º: “I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. Então, o que espera o mercado de trabalho brasileiro de seus pretensos candidatos?!
Segundo o próprio censo demográfico tem apontado, a população brasileira tende a se apresentar cada vez mais velha, graças ao avanço da ciência e da busca constante pela pratica de um modelo de saúde preventivo. Assim, as pessoas estão estendendo mais e mais o seu desempenho profissional e dessa forma, deixando menos oportunidades abertas aos futuros ingressantes. Muito além do interesse pessoal do trabalhador mais velho, que se mantendo no rol economicamente ativo da população garante uma expectativa de recursos mais significativa para sua sobrevivência, o mercado também tem favorecido a permanência desses profissionais em razão da larga experiência adquirida ao longo dos anos. Sim! Experiência se constrói no compasso do tempo! Vivemos a era da tecnologia de ponta, dos mecanismos de informação em constante aprimoramento, mas tudo isso são ferramentas, as quais dependem de um conhecimento acumulado e vivenciado para culminar em sucesso. Além disso, funcionários mais experientes apresentam um comprometimento maior com o trabalho, são mais assíduos, mais proativos, mais dispostos a “vestir a camisa”.
Enquanto paramos para pensar nesse viés, na outra ponta da historia não param de aportar no mercado jovens cidadãos à procura do primeiro emprego ou de uma nova oportunidade. Alguns, poucos, chegam munidos de conhecimento satisfatório, de uma preparação adequada para enfrentar a disputa e satisfazer as demandas; mas, a grande maioria está distante disso. É o contingente que preenche os relatos diários da mídia, no que diz respeito à fragilidade do sistema educacional e o total despreparo para o ingresso no mercado de trabalho. De posse do diploma ou do certificado de conclusão, o pobre papel que tem em mãos não comprova de fato a sua capacidade para o exercício desta ou daquela função. Então, a inexperiência da idade somada à precariedade da formação impede o preenchimento das vagas disponíveis. Por isso sobram oportunidades, sobram desempregados; a conta não fecha!
Em meio a esse turbilhão ainda há a realidade de uma migração internacional. Com a crise econômica em diversos países da Europa e nos Estados Unidos, milhares de pessoas têm desembarcado no país em busca de emprego e um recomeço para suas vidas. Grande parte deles traz um nível educacional e cultural melhor do que o nosso e facilmente conseguem suprir a oferta de vagas ociosas; afinal, o país não pode parar até que sua população esteja pronta!
Ora! Mas não há só espinhos! Na gigantesca massa de trabalhadores brasileiros há gente verdadeiramente pronta para esse “arregaçar as mangas” e que, sem maiores explicações, fica de fora das seleções. Trata-se de pessoas qualificadas, com experiência, visivelmente em condições superiores à grande maioria.  Mas, há sempre um “senão” impedindo que eles sejam considerados aptos para o exercício de uma função, sendo genericamente definidos como “o perfil não enquadra”. Mas, que garantias tão precisas esse tal “perfil” dá a quem escolhe, hein?! O individuo não falha nunca, não desiste, não fica desmotivado jamais,...?! Faz-me até lembrar Chaplin, em Tempos Modernos, quando ele satiriza a especialização da mão de obra na indústria, ao ponto de um funcionário que apertava parafusos ficar condicionado a fazê-lo em qualquer hora e lugar. Parece que se temos o “perfil” de “apertar parafusos” teremos que mantê-lo até o fim de nossos dias. Sorte dos que já se foram desse mundo! Imagina Drummond não podendo mais ser escritor e poeta, porque era antes disso funcionário público?! E Guimarães Rosa, que era médico e escritor ao mesmo tempo?! Joelmir Beting, sociólogo de formação e jornalista por vocação e excelência?! E de “perfil” em “perfil” vão pondo à margem milhares de pessoas que poderiam fazer a diferença positivamente. É! Está difícil remar contra tantas marés! As pedras no caminho se multiplicam a olhos vistos e até auxiliam a fomentar a famigerada prática “do quem indica – QI”.
Viver é um contínuo experimentar, conhecer, escolher, refletir! Que sentido há então, na evolução das espécies, se não for dar a elas a oportunidade de se readaptarem ao meio?! A raça humana é uma capsula de informações e inventividade. Podemos ser muitos no exercício daquilo que nos propusermos a realizar e para isso, dependemos de oportunidades qualitativas e quantitativas. Oportunidades de uma boa educação, de uma boa leitura, de uma ampla cultura, de um bom desenvolvimento físico e intelectual. Oportunidades que se constroem na infância e perfazem até o último dia de nossa existência. Quanto mais pessoas preparadas, qualificadas, dispostas a fazer, melhor! Precisamos de mestres que façam seus discípulos notáveis, que repassem com qualidade os seus conhecimentos, que sejam capazes de realizar essa tarefa multiplicadora; afinal, ninguém controla o relógio da vida e cada um que de repente se vai, ainda que ninguém substitua ao outro em essência, é um a menos para ajudar a afinar o discurso, ou melhor, a mover o progresso e o desenvolvimento da nação! 

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