O
sabor do sal
Por
Alessandra Leles Rocha
Há
algumas semanas o país se desdobra entre duas vertentes de discussão
importante: a “explosão grevista” de diversos segmentos do funcionalismo
público federal (em alguns estados, também o estadual) 1
e o julgamento no Supremo Tribunal Federal do caso conhecido como Mensalão 2. Distante de quaisquer partidarismos ou
paixões políticas, a realidade apenas nos cobra uma reflexão de fatos que se
traduzem no ranço secular da nossa história.
Com
relação ao julgamento, ainda que represente um acontecimento importante para as
paginas do país, prefiro aguardar o desfecho ao invés de conjecturar sobre esse
episodio e reforçar a velha prática de simplesmente reclamar sobre “o leite
derramado”. A decisão final terá significância no sentido de dar-nos uma
satisfação; mas, bom mesmo será se ela conseguir remover as traves da visão
popular e arar a consciência para uma transformação ética e moral renovadora e
consistente, revelando o desgaste e a fragilidade da praxe do “jeitinho”. Sendo
assim, opto por discorrer sobre o que se encontra bem mais próximo e impactante
ao nosso cotidiano, as greves.
Creio
que sejam poucos os que ainda acreditam que o governo fabrica dinheiro na
medida de suas necessidades, ao contrário de que todo o recurso financeiro
empregado na administração pública sai tão somente dos veios caudalosos da
arrecadação tributária. Desse modo, tudo o que é feito de bom ou ruim no
contexto governamental (seja ele municipal, estadual ou federal) advém da nossa
contribuição, do nosso esforço laboral diário; somos nós que sempre pagamos a
conta da saúde, da educação, da segurança, das obras,...
E
enquanto suamos a camisa e depositamos regiamente nossa fração contribuinte
enfrentamos os reveses da economia e as perdas salariais inevitáveis. O poder
de compra reduzindo, os impostos aumentando, a ineficácia dos serviços
prestados nos obrigando a pagar novamente por eles, enfim... não bastasse tudo
isso é do nosso bolso que saem os salários do funcionalismo público, incluindo
os nossos representantes do Executivo, do Legislativo e do Judiciário.
Com o
poder decisório nas mãos, Executivo e Legislativo decidem sobre os salários de
todos; pena que o calculo dos mesmos não obedeça a uma mesma regra! Sendo eles constituintes
da pequena parcela da pirâmide, seus salários são reajustados em índices
expressivos, distantes daquele aplicado ao salário da grande massa e que se
corrói facilmente aos descontos e a inflação. Sem esquecer que em cima do valor
salarial, eles também usufruem do cálculo de outras benesses a completar a
receita: auxílio moradia, auxílio paletó, verba de gabinete, por exemplo.
É! Do
parco salário mínimo, a grande massa faz milagre e paga aluguel, compra roupas
e calçados, desconta percentual de transporte, etc.etc.etc. e quando é a vez de
receber um aumento suficientemente capaz de eliminar as perdas, o choramingo
recheado de “justificativas” dos gestores financeiros transforma o caso em
disputa repleta de idas e vindas, de propostas de pagamento escalonado. Só
lembrando que enquanto a Comissão
Mista de Orçamento aprovou por unanimidade, agora em julho, o texto base da Lei
de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2013 um salário mínimo no valor de R$
667,75 mensais, aumento de 7,36% em relação ao valor atual, de R$ 622 3; em 2011, os parlamentares já haviam
reajustado seus próprios salários em 62% (deputados e senadores ), 134% o
salário da Presidência e 149% dos ministros 4,
pagos de forma integral.
Portanto, essa “explosão grevista” não
é obra do acaso, nem injustificada; ela representa muito bem a desesperança,
uma sensação de nadar, nadar, e morrer na praia, frente a recorrente construção
de abismos e desigualdades sociais. Na hora de reunir o montante, os recursos
são de todos, mas na hora de distribui-los há diferenças! Embora, o cálculo do
salário do funcionalismo público também não seja sobre o salário mínimo e sim,
sobre pisos funcionais específicos, o mesmo tem reajuste sempre aquém do topo
da pirâmide. Nada de contemporâneo em nossa história, apenas o retrato de
séculos da engrenagem administrativa nacional! Mas, porque tem sido assim, não
significa que não haja tempo para transformações! Justamente agora, em que os
últimos anos se desdobram em reflexos de uma grave crise econômica mundial, é
preciso inovar para reaquecer a economia; um ganho salarial significativo é,
sem dúvida, uma alavanca nesse sentido. Na medida em que o mercado de trabalho
também tem imposto a necessidade de mais conhecimento e melhor qualificação
profissional, se torna imprescindível o pagamento de um salario compatível, que
motive e faça jus ao sacrifício do trabalhador. Aqui e ali, o que se espera é
que as travas, que limitam ou impedem o progresso e o desenvolvimento, sejam
verdadeiramente rompidas; a velha a fórmula seja aplicada: bons salários
descrevem a satisfação da população, a geração de empregos, a melhoria no poder
de compra, a promoção de investimentos, e a ampliação de serviços. Que o sal 5 passe a ter o seu verdadeiro sabor; uma
mistura de sonhos, de fé, de trabalho, de suor e mel!