sexta-feira, 8 de agosto de 2025

Enquanto isso, no Senado Federal ...


Enquanto isso, no Senado Federal ...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

41 senadores da República assinam pedido de impeachment do Ministro Alexandre de Moraes. Como já escrevi em diversas ocasiões, a ultradireita brasileira não está só nas suas empreitadas, ela atua em conjunto com os demais matizes da Direita nacional. Isso explica parte dessa ação, a qual não diz respeito exclusivamente a um único ministro do Supremo Tribunal Federal (STF); mas, a todos que, de uma maneira ou de outra, venham a desagradar os interesses dos participantes desse referido espectro político-partidário.

Surpresa? Não. Todos os países, cujas democracias colapsaram, utilizaram desse expediente. Inibir, cooptar, destituir, cassar, ... têm sido práxis comuns empregadas pela ultradireita global, em relação às Supremas Cortes de seus países. Mais do que legislar em favor de si mesma, a ultradireita não quer ser confrontada, questionada, responsabilizada, diante de suas investidas no poder. Ela não aceita obstáculos de nenhuma natureza. Ela quer uma justiça que haja com total parcialidade aos seus interesses.

O curioso é que a Direita brasileira e seus matizes; sobretudos, os mais radicais e extremistas, utilizam como um de seus argumentos principais, contra o referido ministro, uma possível ausência de imparcialidade. Veja só! Aliás, é bom esclarecer os princípios estabelecidos pela lei n.º 1.079, de 10 de abril de 1950, os quais definem através do artigo 39 1 os crimes que levariam um membro do STF a sofrer um processo de impeachment. E exercendo a ética, como princípio para essa leitura, se vê claramente uma tentativa da Direita brasileira e seus matizes; sobretudos, os mais radicais e extremistas, de enviesar e distorcer a interpretação da lei, para satisfazer seus propósitos.

Contudo, eu chamo atenção para o fato de que, enquanto esses elementos do parlamento nacional criam esse tipo de tensionamento institucional, estão deixando de cumprir o juramento constitucional proferido no ato de sua posse, ou seja, "’Prometo guardar a Constituição Federal e as leis do país, desempenhar fiel e lealmente o mandato de senador que o povo me conferiu e sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil’. Após a leitura desse compromisso pelo senador mais idoso, os demais senadores confirmam o juramento com a frase: ‘Assim o prometo’".  Portanto, eles estão, segundo o Código de Ética e Decoro Parlamentar do Senado Federal, utilizando as prerrogativas do cargo de forma inadequada, para prejudicar terceiros; bem como, utilizando o cargo para obter vantagens para si ou para terceiros, através de condutas, tais criar obstáculos para outras pessoas.

É, esses senadores não estão nem aí para os interesses do país e de seus eleitores! Deveriam estar defendendo, com unhas e dentes, a soberania nacional, ao invés de se apequenarem reafirmando a verborragia mentirosa dos EUA e sua ultradireita raivosa, contra o STF. Sim, estão passando recibo, em três vias, da sua sabujice, do seu servilismo, colonial. Estão envergonhando a pátria que os pariu e os sustenta a valores exorbitantes!   Daí a necessidade de lembrar sempre: “Para demagogos cercados por restrições constitucionais, uma crise representa uma oportunidade para começar a desmantelar o inconveniente e às vezes ameaçador sistema de freios e contrapesos que vem com a política democrática” (Steven Levitsky e Daniel Ziblatt - “Como as democracias morrem, 2018).


Como folha de bananeira ...


Como folha de bananeira ...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Para colocar fim ao radicalismo desavergonhado que se manifestou no Congresso Nacional, no início dessa semana, foi feito um acordo. Eis que um assunto adormecido emergiu para colocar fim ao impasse. Estou falando do fim ao foro privilegiado.

Também conhecido como foro por prerrogativa de função, trata-se de um instrumento jurídico, o qual estabelece que determinadas autoridades públicas, como parlamentares, devem ser julgadas por tribunais superiores em razão do cargo que ocupam. Tem como objetivo proteger a função pública e garantir que autoridades de alta relevância sejam julgadas por órgãos com maior experiência e independência, evitando potenciais perseguições políticas ou decisões arbitrárias.

Mas, por que, justamente nesse momento da história brasileira, querem os parlamentares acabar com o foro privilegiado? Essa é uma forma de impunidade para autoridades acusadas de crimes, pois elas seriam julgadas em instâncias inferiores, portanto, com julgadores menos experientes e mais suscetíveis a pressões externas. Isso, sem contar a demora do rito, que poderia levar décadas para ser concluído e se obter uma sentença final.

Assim, essa parece a saída encontrada pelos extremistas da ultradireita e seus apoiadores e simpatizantes, diante do fato de que o projeto de anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro é inconstitucional. Anistiar crimes contra o Estado Democrático de Direito, previstos na Lei 14.197/2021, contraria a própria Constituição, que estabelece que esses crimes são inafiançáveis e imprescritíveis; bem como, poderia ser vista como uma interferência indevida do Poder Legislativo no Poder Judiciário, violando o princípio da separação de poderes.

Mas, como na vida e na política nada acontece por acaso, essas pautas extravagantes vieram à tona depois que o ex-presidente da República se tornou réu em processo que corre no Supremo Tribunal Federal (STF). Ele próprio “manifestou apoio a uma Proposta de Emenda à Constituição que acaba com o foro privilegiado”, afirmando “que, se fosse promulgada, a emenda constitucional levaria seu julgamento do Supremo para a primeira instância” 1.

Parece que ele se esqueceu as razões pelas quais está sendo julgado pelo STF: Organização criminosa armada. Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Golpe de Estado. Dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima. Deterioração de patrimônio tombado.

Portanto, a impressão que se tem é de que esses indivíduos ainda não entenderam que tais ideias e atitudes causam uma flagrante sensação de impunidade, a qual enfraquece diretamente a confiança da população, não só em relação ao Parlamento brasileiro quanto a uma significativa parcela da classe político-partidária nacional.

Como diz a expressão popular, "mudam de opinião como folha de bananeira", ou seja, são pessoas dotadas de total instabilidade e falta de convicção, alterando suas opiniões com frequência e facilidade, sem firmeza de decisões. No fim das contas, estão sempre legislando em causa própria! Sempre gerando um conflito de interesses. Sempre afrontando a justiça das leis. Sendo assim, quem se opõe à anistia, também, deve se opor ao fim do foro privilegiado.


quarta-feira, 6 de agosto de 2025

O Brasil na mira do radicalismo desavergonhado


O Brasil na mira do radicalismo desavergonhado

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Caro (a) leitor (a), a regra é clara! Basta ler o que diz o Código De Ética e Decoro Parlamentar, da Câmara dos Deputados, em seu art. 4º, inciso I, e art. 5º, incisos I, II, III, IV e X 1; bem como, o Código de Ética e Decoro Parlamentar, do Senado Federal, em seu art. 5º, incisos I e III 2.

O que fazem certos elementos ultrarradicalizados da Direita brasileira, nesse momento, é reduzir a pó de traque a sua própria imagem parlamentar. Na medida em que estão publicamente abstendo-se do seu compromisso regimental e constitucional, junto ao eleitorado que os escolheu como representantes.

Nessas alturas do campeonato, tudo o que eles conseguem demonstrar, com seus chiliques e esperneios, é o enorme desprezo que nutrem pelo país e seus pouco mais de 218 milhões de habitantes. Estão tentando a qualquer custo reafirmar a sua idolatria colonial, sabuja, servil, que não se importa e, jamais se importou, com certos valores, tais como a soberania, a dignidade, a democracia e o Estado de Direito.

Até parece que estão buscando compensar, de alguma forma, o seu lamento por não terem estado presentes nos acontecimentos do 08 de janeiro de 2023! Quando os prédios dos Poderes da República brasileira, em Brasília/DF, foram bárbara e incivilizadamente depredados e vandalizados, por uma turba golpista. E tal episódio incluiu o próprio prédio do Congresso Nacional.

Ora, esses parlamentares que, agora, exibem sem quaisquer pudores o seu radicalismo desavergonhado, na casa legislativa da República, não só o fazem em defesa de uma anistia ampla e irrestrita aos acusados pelos ataques do 8 de janeiro, em 2023, e o impeachment de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), como saem em defesa do ex-presidente brasileiro, que cumpre prisão domiciliar por quebra de medidas judiciais cautelares, do tarifaço imposto pelos EUA e da ingerência estadunidense em assuntos internos ao Brasil.

Vamos e convenhamos, se esses traidores da pátria não querem trabalhar pelo país, não querem defender as pautas de seus eleitores, devem ter seus salários e penduricalhos cortados, por justa causa, como acontece com qualquer trabalhador que faz bagunça, confusão ou desordem no ambiente de trabalho. Mas, não é só isso. É fundamental, também, abrir processo no Conselho de Ética a fim de zelar pela dignidade da casa legislativa nacional, diante das condutas que violam flagrantemente o decoro parlamentar.

Assim, prestemos bastante atenção aos fatos. Não é por se tratar de um radicalismo desavergonhado, que ele é menos perigoso, menos importante. Segundo José Ortega y Gasset, importante filósofo espanhol, “Vivemos num tempo de chantagem universal, Que toma duas formas complementares de escárnio: Há a chantagem da violência e a chantagem do entretenimento. Uma e outra servem sempre para a mesma coisa: Manter o homem simples longe do centro dos acontecimentos”.


terça-feira, 5 de agosto de 2025

Tudo está às claras ...


Tudo está às claras ...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

É, o Brasil rasgou a fantasia! Tudo está às claras; sobretudo, a sua fragilidade identitária nacional, se assim podemos dizer. Bem, particularmente, apesar de passados pouco mais de 500 anos de história, não consigo afirmar; sobretudo, diante dos últimos acontecimentos, se algum dia tivemos consciência de quem somos enquanto nação.

A verdade é que o país tem sim, se permitido reproduzir os velhos padrões da sua historicidade colonial. A sabujice que se instalou no inconsciente coletivo nacional dá provas concretas disso. Hastear bandeiras de outros países. Aceitar a ingerência internacional em detrimento da soberania brasileira. Venerar autoridades estrangeiras. Afrontar abertamente os nossos princípios e valores constitucionais. ... Nem adianta negar!

O fato de não termos consolidado e nos apropriado da nossa identidade nacional, a qual significa apresentar um senso compartilhado de identidade coletiva, fundamentado pelo sentimento de pertencimento a uma nação, construído através de laços culturais, históricos, linguísticos e sociais, tem sim, o peso da influência aristocrática brasileira. Diante de suas regalias, privilégios e poderes, essas pessoas se apropriaram do país de tal forma, que não era do seu interesse que as outras camadas da pirâmide social desenvolvessem algum tipo de ambição por pertencimento.

Não é à toa, então, os motivos que levaram a aristocracia brasileira contemporânea, em seus mais diversos espectros, a apoiar e a financiar toda a complexa trama golpista que se encontra sob julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF). Ou o fato de existirem cidadãos brasileiros, inclusive, parlamentares em mandato, cometendo crime de "lesa-pátria" a partir de território estrangeiro. Ou o episódio do dia, em que parlamentares de oposição ocuparam mesas do Congresso nacional e usaram esparadrapo na boca em protesto contra a prisão do ex-presidente da República, que é réu na trama golpista, já citada. Se não diz tudo, diz muito!

Caro (a) leitor (a), isso é suco concentrado da historicidade brasileira! Veja, a identidade nacional não é algo fixo e imutável, mas sim um processo contínuo de construção social. Acontece que no Brasil, essa dinâmica processual nunca esteve em discussão, por conta dos interesses aristocráticos, os quais foram sendo repassados de geração em geração, sem sustos ou sobressaltos. E a construção da identidade nacional envolve a criação de um senso de pertencimento, por meio de elementos diversos, os quais são influenciados pelas mudanças sociais, políticas e econômicas.

Haja vista, por exemplo, o fato de que esse ano, o Brasil celebra os 30 anos do reconhecimento oficial da existência de trabalho escravo contemporâneo no país; mas, em todo o território nacional, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) resgatou mais de 2 mil pessoas em condições de trabalho análogo à escravidão em 2024, e 66 mil ao longo desses últimos 30 anos. Isso é consequência de uma história que, vem sendo compartilhada, há séculos, excluindo eventos significativos, heróis e mitos, moldando uma identidade nacional incompleta, enviesada e não efetivamente representativa Tampouco, capaz de exercer a sua identidade nacional.

Sei que há muita gente chocada e escandalizada, por aí, por conta das recentes expressões da anticidadania e da antidemocracia brasileira. Bem, mas como é possível entender, esse não pode ser considerado um arroubo contemporâneo! Basta uma pitada de atenção, aqui e ali, para perceber como a anticidadania exerce um papel atuante no país, em pleno século XXI. A falta de envolvimento ativo e responsável dos indivíduos na vida política e social do país, é consequência de um silenciamento histórico, de uma segregação identitária flagrante.

Razão pela qual o senso antidemocrático emerge para reafirmar as atitudes, as práticas e os sistemas, que se opõem ou rejeitam os princípios e valores da democracia, valendo-se, por exemplo, da negação da participação popular, da restrição de liberdades individuais e da busca por regimes autoritários ou não representativos. Daí a fúria das aristocracias, no Brasil, especialmente, no que diz respeito aos seus representantes político-partidários, em desrespeitar as leis e as normas sociais vigentes.

Por essas e por outras, o cenário não é lastimável apenas pelo fato de que o Brasil existe em tempo suficiente para ter consolidado a sua identidade nacional; mas, porque se permite alimentar a nova fome imperialista contemporânea. Não se constrange e nem se envergonha por exercer a sabujice, o servilismo, a bajulação, a submissão, de maneira tão degradante. Um sinal claro de que, para uns e outros, por aí, o ranço colonial não foi superado!  Ele ainda bate forte e sentimental!


domingo, 3 de agosto de 2025

O mundo sob ameaça da raridade


O mundo sob ameaça da raridade

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Sei que boa parte da humanidade não percebe que estar sobre a terra significa caminhar pisando em ovos. Recapitulando os ensinamentos da geografia, as camadas internas da Terra são a crosta, o manto e o núcleo. No que diz respeito à crosta, ela é composta pelas chamadas placas tectônicas, grandes blocos rochosos rígidos que compõem a litosfera, a camada mais externa. Portanto, elas podem ser continentais (sob os continentes) ou oceânicas (sob os oceanos), ou mistas (contendo tanto crosta continental quanto oceânica).

Acontece que essas placas estão em constante movimento sobre a astenosfera, uma camada mais fluida do manto terrestre, e suas interações são responsáveis por fenômenos como terremotos, vulcões e a formação de montanhas e oceanos. E tais movimentos podem ser de três tipos: convergentes (colisão), divergentes (afastamento) e transformantes (deslizamento lateral).

Aliás, recentemente, um forte terremoto de magnitude 8,8 atingiu o extremo leste da Península de Kamchatka, na Rússia, provocando ondas gigantes em diversas partes do Oceano Pacífico e alertas de tsunamis. Esse tremor ocorreu no Círculo de Fogo do Pacífico, uma área conhecida por sua alta atividade sísmica e vulcânica. Embora não haja relatos diretos de erupções vulcânicas causadas pelo terremoto, algumas regiões próximas a vulcões ativos, observaram aumento da atividade sísmica e, em alguns casos, erupções.

Então, pensando a respeito das ameaças naturais, as quais a crosta terrestre precisa lidar; mas, que também nos afeta enquanto habitantes do planeta, não pude deixar de me deparar com as ameaças antrópicas. É, o próprio ser humano vem constituindo uma série de ameaças à sua própria sobrevivência! As práxis mineradoras são um exemplo. E não se engane, não se trata de algo recente!

Tudo começa na pré-história, a partir das evidências de extração de minerais, tais como a hematita, para pinturas e rituais, datando de 40.000 a.C. Diante do desenvolvimento humano, a metalurgia do cobre e a produção de ligas se desenvolveram entre 7000 a.C. e 4000 a.C.. Já a produção de bronze começou por volta de 2600 a.C. De modo que a atividade de mineração é milenar, passando por diferentes etapas e se adaptando às necessidades das sociedades.

Feita essa breve consideração, comecei a refletir, então, a respeito dos impactos que a mineração no planeta vem gerando ao longo do tempo, por conta da grande discussão que se estabeleceu a respeito de o Brasil dispor da segunda maior reserva das chamadas terras raras. Um grupo de 17 elementos químicos de alto interesse econômico para o desenvolvimento científico e tecnológico da humanidade. Além do fato de o país se destacar por outras vantagens “como matriz energética limpa, território estável, tradição mineradora e conhecimento técnico” 1.

Afinal, é preciso lançar um olhar isento e realista sobre a mineração. Embora seja essencial para o fornecimento de recursos, ela acarreta sim, diversos efeitos colaterais negativos para o equilíbrio geológico e socioambiental da Terra.

Isso inclui a degradação da paisagem, a contaminação do solo e da água, as alterações e desestabilizações no relevo, e mudanças significativas na dinâmica hídrica. Essas consequências podem levar a problemas ambientais graves e impactos socioeconômicos significativos nas comunidades locais.

E analisando pela perspectiva dos minerais de terras raras, eles são encontrados em diversas profundidades da crosta terrestre, ou seja, da superfície até maiores profundidades. Assim, os principais processos de mineração para extração desses minerais envolvem a lavra (extração do minério), o beneficiamento (separação do minério da ganga) e o processamento metalúrgico (refino e separação dos elementos individuais). O que significa que diferentes métodos são utilizados dependendo da localização e tipo do depósito.

Bem, considerando que a quantidade extraída durante a mineração em si, varia bastante, dependendo da mina e do tipo de minério, a recuperação deles pode ser um processo complexo e caro, inclusive, demandando desenvolver tecnologias mais eficientes e sustentáveis para a extração e o processamento.

Afinal de contas, a exploração de terras raras pode ter impactos ambientais significativos, tais como contaminação química e radioativa. Sem contar, que esse processo minerador gera uma quantidade significativa de resíduos, com estimativas de até 2.000 toneladas de resíduos tóxicos para cada tonelada de terras raras produzida. E o processamento dessas matérias-primas pode contribuir com até 30% das emissões globais de gases de efeito estufa.

Esse é, portanto, o ponto nevrálgico! Embora, métodos como o empilhamento a seco, após a retirada da umidade, e o desenvolvimento de produtos químicos específicos para a separação das terras raras, sejam algumas das abordagens utilizadas, é preciso lembrar que certos rejeitos incluem elementos radioativos, tais como o urânio e o tório, os quais demandam um tratamento mais específico e cuidadoso a fim de evitar a contaminação do solo e da água.

Diante do frisson a respeito das terras raras, o qual vem apontando para o mesmo encantamento desmedido e irresponsável, que se viu durante o Metalismo, entre os séculos XV e XVIII, esses aspectos não podem ser negligenciados, invisibilizados e/ou flexibilizados, em nome dos interesses econômicos.

A falta de regulamentação adequada para o tratamento desses rejeitos, por exemplo, pode levar a problemas ambientais gravíssimos e, em alguns casos, irreversíveis. A relação custo/benefício dessa mineração, a partir da observância do tratamento de rejeitos, pode traduzir em inviabilidade, dado o alto custo operacional, especialmente para minérios com baixo teor de terras raras.

De modo que os esforços empregados para a satisfação econômica, podem significar, na verdade, a ocorrência do deslocamento de populações, por conta da perda de áreas de cultivo, florestas e outros recursos naturais, importantes para as comunidades locais, afetando sua subsistência e modo de vida. A exposição a substâncias tóxicas liberadas pela mineração pode causar, também, problemas de saúde em trabalhadores e comunidades próximas, incluindo doenças respiratórias e intoxicações.

Por essas e por outras, é que existe uma necessidade real de se buscar métodos de mineração e tratamento de rejeitos que sejam sustentáveis e minimizem os diversos impactos ambientais já estimados. Afinal de contas, as reservas de terras raras são finitas, dada à dificuldade em encontrá-las. Esses minerais estão frequentemente dispersos e misturados com outros, dificultando a sua separação e extração.

Assim, não nos esqueçamos: “Muitas vezes erra não apenas quem faz, mas também quem deixa de fazer alguma coisa” (Marcos Aurélio – Imperador Romano). E isso ocorre, porque “Todos os erros humanos são fruto da impaciência. Interrupção prematura de um processo ordenado, obstáculo artificial levantado em redor de uma realidade artificial” (Franz Kafka – escritor tcheco).


segunda-feira, 28 de julho de 2025

EUA e seu monólogo contemporâneo


EUA e seu monólogo contemporâneo

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Preste atenção. As entrelinhas da questão do tarifaço precisam ser lidas. Velhos hábitos nunca morrem e, por esse motivo, não há como estabelecer quaisquer parâmetros de comparação em relação a dialogia estadunidense, diante dos diferentes players da geopolítica atual. Há sim, uma franca distinção de importância dada aos países afetados pela práxis extorsiva das tarifas impostas pelos EUA.

No caso brasileiro, não há como negar o papel da nossa historicidade colonialista; mas, não de forma direta. O que está fermentando esse caldo de animosidade estadunidense, é que o Brasil não é mais um celeiro de exploração dos interesses diversos internacionais, com as bençãos de sua elite burguesa, como ocorreu durante muito tempo. Inclusive, durante o Golpe Militar de 1964 e os longos anos de ditadura que se sucederam até 1985.

A ascensão de governos progressistas, a partir dos anos 2000, sinalizou para a Direita e seus matizes, nos EUA, uma mudança indigesta para a dialogia e os interesses entre os países. Especialmente, porque o Brasil emergiu potente e vibrante o seu protagonismo internacional, rompendo com a velha imagem de “quintal dos EUA”, tão enfatizada durante os tempos da Guerra Fria.

Aí começa a análise. Ao se deslocar da posição de subserviência, de servilismo, presente na sua historicidade colonial e, por algum tempo, pós-colonial, o Brasil passa a representar um desafio concreto aos interesses geopolíticos dos EUA; sobretudo, da sua ala direitista mais radical e extremista. Acontece que essas pessoas estão estrategicamente presentes, nesse governo atual dos EUA, defendendo os interesses das Big Techs.

 E o primeiro ponto de desavença entre Brasil e EUA, se deu por conta da discussão a respeito da regulamentação das redes sociais em território brasileiro, pelo Supremo Tribunal Federal (STF).  Algo que desagradou profundamente aos interesses estadunidenses, porque impõe limites, sob diferentes aspectos, ao ambiente digital. O que comprometeria não só o potencial catalisador de mudanças e da formação de opinião pública; mas, afetaria a monetização de práxis eticamente condenáveis, tais como, a disseminação de pós-verdade (Fake News).  

Depois veio o papel do rearranjo global a partir dos BRICS. O bloco de países constituído inicialmente por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, tem como papel primordial ser um foro de articulação político-diplomática de países do Sul Global e de cooperação nas mais diversas áreas. Tanto que, mais recentemente, se juntaram a eles a Arábia Saudita, o Egito, os Emirados Árabes Unidos, a Etiópia, a Indonésia e o Irã.

Ora, o mundo contemporâneo vive a sombra de uma nova polarização geopolítica entre os EUA e a China. Portanto, a articulação político-diplomática entre esses países causa um terrível mal-estar aos estadunidenses. Sobretudo, porque além de fortalecer a cooperação econômica, política e social entre seus membros, promove-se um aumento da influência dos países do Sul Global na governança internacional. Algo que gera legitimidade para lutar por uma equidade na participação e na eficiência das instituições globais, tais como a ONU e a OMC.

Tudo que o atual governo dos EUA não deseja em hipótese alguma. Então, como a dialogia estadunidense segue um parâmetro próprio para cada interlocutor, é compreensível que eles considerem, no palco da disputa de força geopolítica, o Brasil como o alvo potencialmente mais viável para atacar e impor-lhe submissão ao governo estadunidense. Bem, mas os tempos são outros. O Brasil é um país soberano, independente e, totalmente, capaz de figurar entre as grandes potências globais, inclusive, na defesa diplomática dos seus interesses.

Então, os EUA decidiram apelar para as terras raras. Trata-se de 17 elementos químicos - lantânio, cério, praseodímio, neodímio, promécio, samário, európio, gadolínio, térbio, disprósio, hólmio, érbio, túlio, itérbio, lutécio, ítrio e escândio – os quais encontram-se pulverizados em todo o planeta; mas, com suas maiores reservas na China e no Brasil, respectivamente. E esses minerais estão no centro de uma das disputas mais acirradas do século XXI, em razão de serem matérias-primas essenciais para a manutenção da tecnologia do futuro.

Recapitulando a polarização geopolítica entre os EUA e a China, a reserva brasileira tornou-se alvo dos EUA. A ideia é de que o acesso aos minerais estratégicos seria o preço a se pagar pela redução das tarifas ao Brasil. O que em suma objetiva retornar o país à sua historicidade colonial, ou seja, os velhos tempos de Colônia de Exploração. No entanto, a extração desses minerais depende de alta tecnologia que garanta a viabilidade econômica do processo exploratório.  Acontece que o Brasil além das grandes reservas naturais, dispõe de outras vantagens importantes, tais como, matriz energética limpa, território estável, uma tradição mineradora e conhecimento geotécnico bem consolidado.

Por isso, o governo dos EUA não quer negociar. Ele acredita que ao levar o tensionamento das tarifas às últimas consequências, serão destruídas todas as arestas que o incomodam em relação ao Brasil. Ele escolheu fazer o jogo geopolítico à margem das instituições globais, para não encontrar limites éticos e morais para as suas pseudonegociações. Aparecendo em parceria de outros atores políticos internacionais, nos veículos de comunicação e de informação, como se estivessem, de fato, realizando acordos, os EUA criam um verniz de legitimidade para os seus apoiadores, financiadores e simpatizantes.

Mas isso não é tudo. Vejam, esse tipo de jogo político se fia na incerteza, que escalona por patamares de interesses cada vez maiores e mais diversos. Quem se submete a ele arrisca a existência concreta de quaisquer garantias, porque o governo dos EUA é quem cria e estabelece as regras. E elas podem mudar, a qualquer momento! Por essas e por outras, é que se torna tão grave a afronta ao Brasil, no que diz respeito à sua soberania, à sua independência.  

Assim, não posso deixar de lembrar das seguintes palavras de Carlos Ruiz Zafón, escritor espanhol, de que “É impossível estabelecer um diálogo racional com alguém a respeito de crenças e conceitos que não foram adquiridos por meio da razão”. Porque, no fim das contas, o resultado dessa intransigência dialógica costuma ser o seguinte: “O diálogo se dá entre iguais e diferentes, nunca entre antagônicos” (Moacir Gadotti - educador e escritor brasileiro).


domingo, 27 de julho de 2025

O ineditismo temporal e todo o seu potencial metamórfico


O ineditismo temporal e todo o seu potencial metamórfico

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Ainda que pareça estranho, as tensões diplomáticas estabelecidas pelos EUA em relação ao Brasil representam um momento único e fundamental para a construção identitária brasileira.  Especialmente, porque sua população pode ampliar as suas análises e reflexões, a partir de todo o arcabouço de informações existentes a respeito do pós-colonialismo.

Aos que desconhecem esse termo, o pós-colonialismo é uma área do conhecimento que busca examinar o modo como o legado do colonialismo continua a moldar as sociedades contemporâneas, tanto em termos de estruturas de poder quanto de identidades e narrativas. Exatamente o que temos visto acontecer amiúde, no Brasil.

Infelizmente, passados pouco mais de 500 anos de história, a colonialidade, que é a estrutura de poder e conhecimento, se manteve mesmo após o fim do colonialismo político em relação à Metrópole portuguesa. As estruturas de organização socioeconômica e de poder buscaram manter os padrões e objetivos do período colonial, mesmo depois do advento da Independência do Brasil, em 7 de setembro de 1882, e da Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889.

No entanto, para além disso, a internalização de valores, crenças e padrões culturais do colonizador permaneceu constituindo um mecanismo de instrumentalização de controle e manipulação social, a partir da percepção de inferioridade da própria cultura e de uma hipervalorização da cultura do colonizador. O que o escritor e jornalista, Nelson Rodrigues, chamou de “complexo de vira-lata”, a respeito dessa tendência nacional de se sentir inferior em relação a outros países, especialmente os desenvolvidos, como os EUA, por exemplo.

O pior é saber que essa modelação da percepção de si mesmo e do mundo, não afeta somente as camadas menos favorecidas e desprivilegiadas da sociedade. Haja vista, o comportamento de certos elementos financiadores, apoiadores e simpatizantes da Direita nacional, em relação aos EUA. Aliás, é o braço elitista da ultradireita brasileira que está se prestando ao papel abjeto de trair o próprio país, em uma flagrante demonstração da prática do crime de "lesa-pátria", ou seja, promovendo atos que atentam contra a segurança, a soberania, a integridade e/ou a dignidade da nação.

De maneira clara e objetiva, esses indivíduos não fazem mais questão de esconder sua índole servil, puxa-saco, bajuladora, herdada dos tempos coloniais. Apesar de saberem muito bem que “Nossa derrota esteve sempre implícita na vitória dos outros. Nossa riqueza sempre gerou nossa pobreza por nutrir a prosperidade alheia: os impérios e seus beleguins nativos” (Eduardo Galeano - jornalista e escritor uruguaio).

Por essas e por outras, é que se torna possível entender a imensa importância desse momento para o Brasil. É tempo de desconstruir as narrativas coloniais e promover a compreensão da diversidade cultural e da justiça social, no amplo contexto geopolítico do mundo.

Pois, segundo Frantz Fanon, psiquiatra e filósofo político natural das Antilhas francesas, "Cada sociedade colonizada é vítima de uma escravidão mental, pois os colonizadores impõem suas próprias referências, seu próprio sistema de valores, e a cultura colonizada passa a se ver através dos olhos do opressor".

Ora, então, “Recuse-se a se tornar um vegetal que simplesmente absorve informações pré-embaladas, pré-ideologizadas, porque nenhuma mensagem é nada além de um pacote ideológico que passou por algum tipo de processamento” (Edward Said - professor, crítico literário e ativista político palestino-estadunidense)!

Esse é o tempo de se apropriar de uma identidade pós-colonial efetivamente distinta, considerando o fato de que “O que devemos eliminar são os sistemas de representação que carregam consigo uma autoridade que se tornou repressiva porque não permite nem dá espaço para intervenções por parte dos representados” (Edward Said).

Preste atenção: “O mundo está dividido principalmente entre indignos e indignados, e todos sabem de que lado querem ou podem estar”. A grande questão é que “O medo nos governa. Essa é uma das ferramentas de que se valem os poderosos, a outra é a ignorância” (Eduardo Galeano). Portanto, se permita parar, pensar e refletir.