segunda-feira, 7 de outubro de 2024

Só a história explica!


Só a história explica!

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Ao contrário de muitos, eu não estabeleço uma correlação direta entre a expansão da ultradireita global com seu segmento nacional. A meu ver, as raízes da Direita brasileira e seus matizes, na verdade, remontam da sua historicidade colonial. A Direita que se constituiu, no país, é herança da corte metropolitana e da burguesia que emergiu a partir do século XVIII. Basta observar o ideário direitista para perceber como tudo isso fica muito evidente.

E no fluxo desse processo, não se pode jamais esquecer a tecitura do fisiologismo político, tão criticado por alguns e tão louvado por outros.  Afinal, ele significa a existência de uma relação político-partidária, na qual o peso das ações e das decisões se estabelece pela troca de favores e outros benefícios de interesses privados, em prejuízo da população.

Ora, não precisa ser nenhum gênio para saber quem participa dessa práxis! Sim, a Direita e seus matizes! Os herdeiros históricos diretos de tal ideário e que, em plena contemporaneidade, já não se faz mais uma distinção, ou qualificação, da sua representatividade mais ou menos extremista. Há tempos, ela vem se homogeneizando, na medida em que se permitiu aceitar e concordar com os despautérios de suas camadas mais beligerantes e estridentes.

Dito isso, não é difícil entender como emergiu, nos últimos anos, um tal “Orçamento Secreto”, no Congresso nacional. Trata-se do mais afrontoso projeto fisiológico já desenvolvido pelo Legislativo federal brasileiro. Razão pela qual, a sua constitucionalidade foi questionada junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), resultando em proibição de tal prática.

Em meio à insatisfação do chamado Centrão, o bloco parlamentar que melhor representa o fisiologismo nacional, logo surgiram novas ideias para substituí-lo. Acontece que, mais uma vez, o STF interveio, obstaculizando o processo a fim de que houvesse uma atenção aos aspectos éticos e morais que envolvem a movimentação de recursos públicos, trazendo mais transparência, mais proporcionalidade, mais interesse público e mais razoabilidade.

No entanto, o tempo da Justiça não é o tempo da Política. Entre idas e vindas no curso processual, montantes expressivos do dinheiro público transitaram sem deixar rastros, especialmente, pelas mãos dos representantes político-partidários do Centrão. Bem, fortalecer a Direita e seus matizes em cada unidade da Federação, especialmente, em ano eleitoral, faz parte do projeto de reafirmação do seu modelo histórico nacional.

O que, em linhas gerais, significa a defesa de um posicionamento social marcado por características conservadoras, tais como a defesa da família tradicional, a religião cristã, a economia livre e regulada pelo mercado, a propriedade privada, a priorização dos direitos individuais em detrimento aos coletivos e a meritocracia. Nitidamente, contrapondo-se aos interesses coletivos, a igualdade social, os direitos trabalhistas, a intervenção do Estado, a justiça econômica e os direitos das minorias, defendidos pela Esquerda.

Assim, surpresa zero, quando os resultados eleitorais foram divulgados! Ainda que alguns municípios venham a disputar o segundo turno, o projeto da Direita brasileira parece ter logrado êxito. A distribuição político-partidária dos eleitos comprova a maciça presença do Centrão, tanto no Legislativo quanto no Executivo municipal. Algo que diz muito sobre a força de um inconsciente coletivo moldado historicamente. É, vivemos uma Democracia com cheiro de mofo!

Enquanto uns e outros defendem a tese de um país polarizado, o que eu consigo enxergar é um país rançoso, chafurdando na sua perversa herança colonial, quando as elites dominantes detinham o pleno controle sobre os poderes, as escolhas e as decisões, e o restante da população era impedida do exercício do seu protagonismo cidadão. É nisso que a Direita brasileira está concentrada, na manutenção desse modelo, na garantia das suas regalias e privilégios em detrimento da grande massa da população.

Aliás, as diversas ocorrências de compras de votos, trocas de favores e violência, ao longo desse pleito eleitoral, são provas cabais dessa percepção. Quanto mais se fortalecem as desigualdades, no país, mais se ampliam as possibilidades de reafirmação do ideário direitista, na medida de encontrar terreno fértil e oportuno para o emprego de certas práxis.  Como escreveu Eduardo Galeano, “O que são as pessoas de carne e osso? Para os mais notórios economistas, números. Para os mais poderosos banqueiros, devedores. Para os mais influentes tecnocratas, incômodos. E para os mais exitosos políticos, votos”.