Só a
história explica!
Por
Alessandra Leles Rocha
Ao contrário de muitos, eu não estabeleço
uma correlação direta entre a expansão da ultradireita global com seu segmento nacional.
A meu ver, as raízes da Direita brasileira e seus matizes, na verdade, remontam
da sua historicidade colonial. A Direita que se constituiu, no país, é herança
da corte metropolitana e da burguesia que emergiu a partir do século XVIII. Basta
observar o ideário direitista para perceber como tudo isso fica muito evidente.
E no fluxo desse processo, não se
pode jamais esquecer a tecitura do fisiologismo político, tão criticado por
alguns e tão louvado por outros. Afinal,
ele significa a existência de uma relação político-partidária, na qual o peso
das ações e das decisões se estabelece pela troca de favores e outros benefícios
de interesses privados, em prejuízo da população.
Ora, não precisa ser nenhum gênio
para saber quem participa dessa práxis! Sim, a Direita e seus matizes! Os
herdeiros históricos diretos de tal ideário e que, em plena contemporaneidade,
já não se faz mais uma distinção, ou qualificação, da sua representatividade
mais ou menos extremista. Há tempos, ela vem se homogeneizando, na medida em
que se permitiu aceitar e concordar com os despautérios de suas camadas mais beligerantes
e estridentes.
Dito isso, não é difícil entender
como emergiu, nos últimos anos, um tal “Orçamento Secreto”, no Congresso
nacional. Trata-se do mais afrontoso projeto fisiológico já desenvolvido pelo
Legislativo federal brasileiro. Razão pela qual, a sua constitucionalidade foi
questionada junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), resultando em proibição de
tal prática.
Em meio à insatisfação do chamado
Centrão, o bloco parlamentar que melhor representa o fisiologismo nacional, logo
surgiram novas ideias para substituí-lo. Acontece que, mais uma vez, o STF interveio,
obstaculizando o processo a fim de que houvesse uma atenção aos aspectos éticos
e morais que envolvem a movimentação de recursos públicos, trazendo mais transparência,
mais proporcionalidade, mais interesse público e mais razoabilidade.
No entanto, o tempo da Justiça não
é o tempo da Política. Entre idas e vindas no curso processual, montantes
expressivos do dinheiro público transitaram sem deixar rastros, especialmente,
pelas mãos dos representantes político-partidários do Centrão. Bem, fortalecer
a Direita e seus matizes em cada unidade da Federação, especialmente, em ano
eleitoral, faz parte do projeto de reafirmação do seu modelo histórico nacional.
O que, em linhas gerais,
significa a defesa de um posicionamento social marcado por características conservadoras,
tais como a defesa da família tradicional, a religião cristã, a economia livre
e regulada pelo mercado, a propriedade privada, a priorização dos direitos
individuais em detrimento aos coletivos e a meritocracia. Nitidamente,
contrapondo-se aos interesses coletivos, a igualdade social, os direitos
trabalhistas, a intervenção do Estado, a justiça econômica e os direitos das
minorias, defendidos pela Esquerda.
Assim, surpresa zero, quando os
resultados eleitorais foram divulgados! Ainda que alguns municípios venham a
disputar o segundo turno, o projeto da Direita brasileira parece ter logrado êxito.
A distribuição político-partidária dos eleitos comprova a maciça presença do
Centrão, tanto no Legislativo quanto no Executivo municipal. Algo que diz muito
sobre a força de um inconsciente coletivo moldado historicamente. É, vivemos
uma Democracia com cheiro de mofo!
Enquanto uns e outros defendem a
tese de um país polarizado, o que eu consigo enxergar é um país rançoso,
chafurdando na sua perversa herança colonial, quando as elites dominantes detinham
o pleno controle sobre os poderes, as escolhas e as decisões, e o restante da
população era impedida do exercício do seu protagonismo cidadão. É nisso que a
Direita brasileira está concentrada, na manutenção desse modelo, na garantia
das suas regalias e privilégios em detrimento da grande massa da população.
Aliás, as diversas ocorrências de compras de votos, trocas de favores e violência, ao longo desse pleito eleitoral, são provas cabais dessa percepção. Quanto mais se fortalecem as desigualdades, no país, mais se ampliam as possibilidades de reafirmação do ideário direitista, na medida de encontrar terreno fértil e oportuno para o emprego de certas práxis. Como escreveu Eduardo Galeano, “O que são as pessoas de carne e osso? Para os mais notórios economistas, números. Para os mais poderosos banqueiros, devedores. Para os mais influentes tecnocratas, incômodos. E para os mais exitosos políticos, votos”.