sexta-feira, 23 de agosto de 2024

Surpresa zero!

Surpresa zero!

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Desde 1982, a Organização das Nações Unidas (ONU) já se dedica a criar um planejamento internacional para o envelhecimento populacional. Em dezembro de 1991, por exemplo, foram aprovados os princípios das Nações Unidas para pessoas idosas, através da resolução 46/91. E 1999 foi declarado o Ano Internacional das Pessoas Idosas.

Até que, em 2002, na II Assembleia Mundial sobre Envelhecimento, realizada em Madri, Espanha, já se tratava da expectativa de que, por volta de 2050, 1 em cada 5 pessoas, no mundo, teria 60 anos ou mais de idade, ou seja, haveria mais pessoas idosas do que crianças no mundo.  O que significa que o envelhecimento populacional já se mostrava um fenômeno real e já não poderia mais ser ignorado.

Portanto, surpresa zero diante da recente projeção divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)! O Brasil está sim, envelhecendo! De modo que o objeto de reflexão aqui é olhar para essa situação com a importância que ela merece; pois, já deveríamos, desde a década de 80, ter iniciado esse caminho.

Não, nosso maior problema em relação a essa mudança na pirâmide etária nacional não diz respeito ao etarismo. De fato, ele existe, é cruel, perverso, abjeto; mas, ele não resume todos os desafios que o tema impõe. A começar pelo fato de que a população idosa não é uma massa homogênea, igualada nas mesmas necessidades, nos mesmos interesses, nas mesmas realidades.

Como diz a canção, “Oh! Mundo tão desigual / Tudo é tão desigual ...” 1. Pois é, o envelhecimento na Inglaterra é diferente do Brasil, que é diferente da África do Sul, que é diferente da China, enfim. Aspectos sociais, econômicos, culturais e políticos interferem na expectativa de vida das populações e, por consequência, no envelhecimento. Isso sem contar que a dinâmica do envelhecimento é atravessada pelo gênero. Homens e mulheres não estão submetidos ao mesmo processo na hora de envelhecer.  

De modo que cada espaço geográfico do planeta precisa tecer as suas próprias políticas para o envelhecimento populacional, que atendam e respeitem a especificidade de suas necessidades. O que, certamente, não muda são os princípios gerais que sustentam esse trabalho, ou seja, independência, participação, cuidados, autorrealização e dignidade2 , em uma clara intenção de incluir e amparar a população idosa.

Um simples olhar sobre o desenvolvimento populacional ao longo da história mundial, nos permite perceber a dimensão das transformações a que foi submetido o envelhecer, no planeta. A participação do idoso na sociedade vem, portanto, sendo cada vez mais significativa e fundamental para alavancar o desenvolvimento e o progresso social como um todo. Porém, os caminhos escolhidos para tratar os desafios que se apresentam, nesse contexto, e otimizar as oportunidades é que fará a grande diferença na colheita dos benefícios desse novo perfil de evolução demográfica.

Assim, é preciso que a população mundial esteja ciente da necessidade de construção de um compromisso político bem consolidado e alinhado a uma base consistente de dados e de conhecimentos, que viabilizem uma efetiva integração intergeracional à realidade processual contemporânea. A humanidade, em todos os lugares, tem o direito fundamental de envelhecer com dignidade, segurança, respeito e liberdade.



1 A novidade (1986). Composição de Gilberto Gil, Herbert Vianna, Bi Ribeiro e João Barone.

2 Princípios das Nações Unidas em prol das Pessoas Idosas (1991).