terça-feira, 22 de novembro de 2022

Ele tinha que manter a sua fama de mau...


Ele tinha que manter a sua fama de mau...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Pois é, ele tinha que manter a sua fama de mau e foi embora assim, de repente! Bem no dia de Santa Cecília, a padroeira dos músicos! Foi compor o coro dos céus, fazer festa no campo celeste, alegrar com seu sorriso doce a plateia dos anjos.

Foram mais de seis décadas de carreira, de um talento que consagrou suas canções para a eternidade. Muitas delas na parceria de seu grande amigo Roberto Carlos.

A sua singularidade humana permitiu que o tempo passasse e ele continuasse transitando pelas gerações com a mesma alegria, a mesma desenvoltura, a mesma acolhida.

Conviver com a pluralidade, talvez, fosse a maior marca da sua personalidade afetuosa e gentil. Parecia que ele estava sempre de braços abertos para receber uma nova parceria, para compartilhar, para trocar o que a vida tem de bom.  

Por sorte, ou por providência divina, ele pode receber a notícia pela vitória no Grammy Latino. Seu último álbum, “O futuro pertence à... Jovem Guarda”, foi escolhido como o Melhor Álbum de Rock ou de Música Alternativa em Língua Portuguesa, na última quinta-feira, 17 de novembro. Pois é, coisas de um garoto de 81 anos!

E se não fosse a música, ele não teria ido tão longe. Afinal, o sucesso traz fama, notoriedade, dinheiro; mas, é insuficientemente capaz de blindar qualquer ser humano contra as adversidades do mundo.

Na vida dele foram muitos momentos sentados à beira do caminho, sentindo a melancolia e a tristeza, até ser capaz de superar e seguir em frente. Lições gigantes de um gigante!

É, ele tinha que ser gigante mesmo, para fazer caber a sua essência, a sua humanidade. Discreto sem ser arrogante, Erasmo Carlos sabia o que dizer, quando dizer e por quê dizer. Tinha o timing certo, perfeito, das palavras tanto na poesia da sua música quanto na vida. Algo que fica no registro da sua atemporalidade.    

De fato, o tempo nunca fez diferença para o Erasmo. Talvez, porque ele simplesmente se permitiu ser ele. Sempre houve identidade no seu trabalho independente do estilo que ele se propusesse trilhar.

Sempre houve leveza nesse processo. Sempre houve prazer. Sempre houve uma busca por compartilhar com o mundo ao invés de simplesmente satisfazer ao mercado da música. E assim, o trabalho árduo, responsável, criterioso, fluía naturalmente.

Agora, é hora do descanso do guerreiro! Como bem escreveu Caio Fernando Abreu, “ADEUS = A-DEUS: Não é uma despedida, é entregar nas mãos de Deus aquilo que você não pode mais cuidar”.

Ele parte com a certeza de uma missão belissimamente cumprida! Um legado inesquecível! Sai a presença física e entra a imortalidade materializada pelo som inconfundível da sua voz, do acervo audiovisual dos veículos de informação e comunicação e das memórias que cada um guarda, mais do que na mente, na alma.

Hoje é dia para entender que “Sem música a vida não faria sentido” (Friedrich Nietzsche). Obrigado, Erasmo! Você trouxe a percepção exata de que “A música expressa o que não pode ser dito em palavras, mas não pode permanecer em silêncio” (Victor Hugo). Daí a razão pela qual sua presença foi tremendamente impactante entre nós. 

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