terça-feira, 24 de maio de 2022

Medo???


Medo???

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Então, é assim, o medo como estratégia de controle social?! Embora não tenham sumido do mapa, as Fake News tiveram sim um arrefecimento considerável. O frisson de outrora perdeu um pouco do gás, depois que uma onda de contestação e enfrentamento desse tipo de notícias ganhou protagonismo. Foram muitos os veículos de checagem desenvolvendo um trabalho sério, sistemático e atuante, a fim de desconstruir as velhas narrativas que giravam ao redor de uma pseudoignorância social impregnada de más intenções.

Porém, isso não significa que o medo deixou de nos rondar. Não. Só que agora ele chega vestido com cara de notícia recém-saída do forno trazida por veículos de informação e comunicação conhecidos. Notícias que causam, ou pelo menos têm a intenção de causar calafrios, tendo em vista que abordam assuntos já tão sensíveis e indigestos à própria realidade nacional, como, por exemplo, o fim da gratuidade no Sistema Único de Saúde (SUS) e nas Universidade Federais e uma “desideologização” do ensino 1.

Acontece que o medo desconforta. E justamente por isso, reduz a capacidade de parar e refletir de maneira isenta e serena a respeito de qualquer assunto. Ora, mas basta uma passada de olhos pela realidade brasileira para computar a quantidade de pequenos “caos” deflagrados por todos os cantos. O momento nacional é péssimo em todos os sentidos.

Primeiro, por conta própria, dada a flagrante ausência de habilidade e competência do governo para manter o país nos trilhos do desenvolvimento e do progresso. Segundo, porque o Brasil, ainda, faz parte do globo terrestre e, por essa razão, sofre direta e/ou indiretamente os impactos reverberados pelas crises que acontecem em outros cantos. Terceiro, porque somatizamos mazelas históricas seculares ao fluxo contínuo e recente de outras tantas.

Isso significa que a população já está amedrontada pelo dia de amanhã. Será que vai ter emprego? Será que vai ter comida no prato? Será que vai ter como encher o tanque do automóvel? Será que vai ter dinheiro para o remédio? Será que a pandemia nunca mais vai passar? Será ...? Será ...? Será ...? Perguntas que tiram o sono, tiram a paz, tiram o sossego, tiram a dignidade das pessoas, porque as lançam em um redemoinho de incertezas aterrorizador e intenso. Que traçam uma realidade inóspita sem prazo para acabar.

Então, quando a turma da extrema direita nacional acha graça em colocar mais pilha na grande massa da população, é realmente algo sem noção! Apologia de estratégias para levar o Brasil a situações que mergulhem de cabeça no aprofundamento da bancarrota nacional, é mesmo surreal. Destruir a dignidade humana das parcelas mais frágeis e vulneráveis do país, que diante da situação atual beiram mais de 70% da população, não sustenta e nem melhora o conjunto de regalias e privilégios dessa gente que vive em outro planeta, ou melhor, em outro século.

De modo que esse tipo de “terrorismo discursivo” não diz nada para coisa nenhuma. Dizer que vão fazer isso ou aquilo, que vão transformar o país na materialização de uma idealização desvairada, é um ataque direto aos próprios interesses dessa gente. Porque se eles acreditam que dilapidando e usurpando os recursos nacionais, até a última gota, vai ser suficiente para a sua sanha, não vai não! Pessoas de espírito absolutista, como essas, não se contentam com pouco, querem mais, e mais, e mais... Mas, de onde só se retira e não se repõe, rapidamente se depara com a escassez. E eles não querem um país pobre, miserável, árido de recursos.

Portanto, diz a lógica do bom senso para se ter prudência e não jogar contra os interesses daqueles que sustentam o topo da pirâmide social brasileira. O seu infortúnio, a sua infelicidade, o seu desespero, não são nada producentes para a sobrevivência do país. E não sou eu quem diz, basta lembrar o que foi a Revolução Francesa, no século XVIII. A monarquia nunca acreditou que o povo poderia chegar ao limite que chegou, que poderiam insurgir contra o topo da pirâmide. E não é que eles provaram o contrário!!! Subestimar os “inimigos” ou “adversários” é um erro crasso.

Ninguém nunca mediu o limite da tolerância brasileira. E mesmo se tivesse medido, está na configuração das conjunturas o balizamento desse limite. Quanto piores elas se tornam, mais se abre possibilidade de ele diminuir. Sem contar que, no momento atual, muita gente que se achava seguro na sua bolha de estabilidade viu a vida puxar-lhe o tapete sem a menor cerimônia.

Pois é, muita gente que comia chuchu e arrotava caviar, agora vende o almoço para comprar a janta, e olhe lá! De modo que, certamente, não são pessoas distribuindo alegria e contentamento, resignação e passividade. Como dizia Martin Luther King, “A verdadeira medida de um homem não se vê na forma como se comporta em momentos de conforto e conveniência, mas em como se mantém em tempos de controvérsia e desafio”.

Lamento, mas cultivar o medo é, além de inútil, absurdamente irresponsável. O saudoso sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, afirmava que “O desenvolvimento humano só existirá se a sociedade civil afirmar cinco pontos fundamentais: igualdade, diversidade, participação, solidariedade e liberdade”. Ele estava corretíssimo! Um pouco de reparo no próprio ciclo das Revoluções Industriais para perceber que elas só chegaram até aqui, porque apesar de muita resistência, de muita intransigência, de conflitos gravíssimos, direitos a priori negados aos cidadãos trabalhadores tiveram que ser legalizados e institucionalizados, para minimizar os prejuízos e os retrocessos.

Por isso, eu adoro essa frase da cientista Marie Curie, “Nada na vida é para ser temido, apenas sim para ser entendido”. Que bom que as notícias estejam nos veículos de informação e comunicação. Que bom que as verdades e as tolices estejam pelos nossos caminhos. Porque, dessa forma, tomamos nas mãos a nossa responsabilidade de exercitar a cidadania. De ler com atenção cada linha. De extrair com personalidade e propriedade cada entrelinha. De analisar, segundo a nossa própria cabeça, cada ideia ali presente. Porque é dessa maneira que o entendimento, o conhecimento, pessoal e intransferível, é aceso dentro de nós. Afinal, como escreveu Louisa May Alcott, “Não tenho medo de tempestades, pois estou aprendendo a navegar meu barco”.

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