Qual é o
seu ideal de felicidade?
Por Alessandra Leles Rocha
Não há como refutar a avalanche promovida pelo desenvolvimento tecnológico.
O “progresso”, como muitos gostam de se referir a esse fenômeno, trouxe seus benefícios;
mas, paralelamente impôs malefícios quase impossíveis de eliminar. A vida
passou a ser encarada como uma guerra diária em que é preciso o máximo da dedicação
extenuante para não estragar as expectativas e manter uma subjetiva segurança
do seu lugar ao sol. Mas, a pergunta que sempre fica é: as eventuais conquistas
desse esforço realmente suprem a nossa essência humana, o nosso ideal de
felicidade?
Muito do que conquistou a raça humana desde o seu aparecimento sobre a
Terra não estava necessariamente previsto no que se pode chamar de “projeto
inicial”; tanto é verdade, que a própria condição biológica do DNA não mantem
ativos todos os nossos genes. Em parte, uma estratégia natural para economia energética
e garantia de se evitar danos aos genes que podem ser uteis em situações de emergência.
Contudo, as transformações externas, ou ambientais, ao longo dos séculos foram
impondo movimentos de readaptação dos seres humanos e desencadeando o
surgimento de novas doenças. Enquanto a tecnologia deveria nos suprir das
melhores condições de sobrevivência, ela passou a ter que desenvolver novas
terapias e mecanismos de controle das antigas e recém-surgidas patologias. Então,
se estamos degradando a própria carcaça, qual o sentido do modelo de evolução
vigente? Esgotar-se a si mesmo e não ter como desfrutar dos árduos anos de
trabalho?
Tenho observado uma tendência interessante, pelo menos entre pessoas que
vivenciaram um limiar muito tênue entre a vida e a morte, de olhar verdadeiramente
para si e reconstruir a sua concepção de felicidade. O choque da contraposição
entre a alegria e a dor costuma ser devastador na alma humana, apesar de
simultaneamente revolver esse terreno de uma forma tão profunda e profícua que
as pessoas conseguem sair de todo o processo revigoradas espiritualmente. Acredito
que a conjuntura social em que vivemos tem sido a grande responsável por essa
movimentação positiva de reavaliação e resgate dos verdadeiros valores humanos.
Quando se chega ao “fundo do poço” só há um caminho: voltar à superfície! Vamos
sendo tão oprimidos, massacrados, espoliados, escravizados por pensamentos,
palavras e ações, que no fim das contas só nos resta abandonar o jogo, as
convenções, as arbitrariedades, as imposições sociais e fazer algo que realmente
nos faça sentir bem e inteiro.
É quando a felicidade nos sorri! A primeira grande descoberta que ela
nos oferece é não se materializar inteira, plena, constante. Podemos ser
felizes aos poucos, em gotas, para não nos enfastiarmos do seu sabor. Podemos ser
felizes em dias tristes, pesados, difíceis, como quem encontra um recanto de
paz no turbilhão do conflito. Depois, ela nos ensina que não vem com etiqueta
de grife, nem com preço a pagar, nem embalada para presente... A felicidade
está naquilo que consegue efetivamente tocar a nossa sensibilidade, eriçar a
nossa pele, fechar nossos olhos na profundeza de um suspiro, desanuviar os
nossos pensamentos. Outra lição importante está na dimensão que ela nos
apresenta sobre nós mesmos. Para ser feliz é preciso compreender plenamente que
se é humano, falível, mortal; nem melhor, nem pior, apenas individual. A aceitação
do incontestável nos faz feliz, nos liberta, nos dá asas para sonhar e agir.
Enquanto insistirmos em sermos algozes da própria existência patinaremos
inertes no lodo, consumiremos as melhores energias em vão; apenas, esperando
inconscientemente o dia em que não mais será possível acordar e ser feliz. Como
disse Thomas Huxley 1, “O
degrau de uma escada não serve simplesmente para que alguém permaneça em cima
dele, destina-se a sustentar o pé de um homem pelo tempo suficiente para que
ele coloque o outro um pouco mais alto” 2.
Parar o tempo, sem dúvida é impossível, por isso a evolução vai continuar o seu
o processo; a questão está em como preservaremos a nossa verdadeira felicidade
sem que o progresso possa danificá-la de alguma forma, ou seja, definirmos qual
é o nosso ideal de felicidade.
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