O
lado atemporal da docência
Por
Alessandra Leles Rocha
Aprender um ofício, ressalvadas
raríssimas exceções, não é difícil. Mas, o que faz desse processo a formação de
um verdadeiro profissional reside em algo bem mais sutil e subjetivo, ou seja,
a disposição em ser e fazer. E foi assim, com base nesse entendimento, que
desde muito cedo aprendi a destacar os meus melhores e os meus piores
professores.
Ensinar não é algo que se aprenda
necessariamente em um curso. Ensinar é algo que transborda, que excede os
limites do corpo e da alma. Por isso, professores (as), quase sempre, se
revelam “ensinadores” muito além dos
muros da escola, naquele jeito único de transmitir conhecimento, mesmo que seja
sobre algo trivial, cotidiano. Sua fala é sempre dotada de explicações
precisas, reforçadas com paciência, imbuídas da intenção de que o outro
entenda, esclareça, de fato, suas dúvidas.
Por isso, nesse mundo de meu
Deus, tanta gente assim foi salpicada por aí! E ainda que não andem com um
crachá escrito “professor”, na lapela, são facilmente identificáveis. Porque os
bons professores transcendem a arte de ensinar, na medida em que fazem dela um
ato absoluto de despojamento e de fraternidade. Vejam que, na história do mundo,
o conhecimento sempre foi um instrumento de poder e de controle; então, quando
alguém decide romper com essa máxima de guardá-lo somente para si, o mundo em
todas as suas instâncias se transforma.
O que, de algum modo, nos permite
entender como se deu o processo de desqualificação e precarização do trabalho
docente em muitas sociedades. Sendo os professores quem são, essa força
grandiosa e ao mesmo tempo delicada de transformação social, aqueles que detêm
o poder não viram outro caminho de manter a sua posição de controle senão subjugando-os
e colocando-os em uma condição de total desprezo.
Sim, porque é dessa forma que a
profissão docente iniciou seu processo de perda do respeito dentro do contexto
social. Foi a partir das diferentes formas de desqualificação e precarização,
que lhes foram impostas, que a ideia de se tornar professor foi sendo apagada e
preterida dentro da própria sociedade. Apesar do reconhecimento da importância,
da entrega profissional, dos sacrifícios diários para o seu exercício, a força
do vale quanto pesa contemporâneo aponta para um retorno capital tão
insignificante que injustifica a decisão de ser professor (a).
De modo que o cenário constituído
por uma maioria de bons e verdadeiros professores se reduz a cada dia. A
transitoriedade docente, por exemplo, tornou-se uma realidade brasileira. Como
se a permanência nas salas de aula tivesse um prazo de validade preestabelecido,
ou seja, até que o profissional consiga uma atividade mais rentável e menos
desafiadora. Então, o número de docentes que se mantêm no mercado de trabalho aponta
para uma insuficiência generalizada, comprometendo o processo de
ensino-aprendizagem dos alunos.
Algo que faz pensar com seriedade,
considerando os estragos feitos pela Pandemia da COVID-19, no campo
educacional. Não só houve um retrocesso de aprendizagem por parte dos alunos;
mas, também, uma evasão escolar maciça que pode vir a representar um abandono
efetivo da escola. O que significa que nunca se precisou tanto, qualitativa e
quantitativamente, dos (as) docentes, como agora. Na medida em que há um risco
iminente de perda intelectual para uma geração inteira.
De repente, as conjunturas
impuseram o seu ponto de inflexão. Como diz o dito popular, “A necessidade faz o sapo pular”. Para que
haja desenvolvimento e progresso nos mais diferentes campos da sociedade serão
necessários cidadãos dotados de conhecimento e capazes de executar suas
habilidades e competências. Portanto, será imprescindível recompor os
contingentes docentes. Pois é, não se poderá mais negligenciá-los, invisibilizá-los,
menosprezá-los!
O que significa ter que resgatar a
dignidade humana e o respeito desses (as) profissionais, investir para a
criação de infraestrutura e logística adequadas para a realização do trabalho, e
formular novos programas didático-pedagógicos que sejam efetivamente
estimulantes para a nova realidade de ensino-aprendizagem vigente. Em síntese,
simplesmente, não é mais possível pensar em longo prazo com os pés fincados em um
passado retrógrado e desconectado da realidade.
Está lançado, portanto, o
desafio! Ao que tudo indica, o mundo contemporâneo começa sim, a se dar conta
de que resgatar o docente, a docência, o conhecimento e a cidadania, nesse grau
de profundidade e complexidade, significa também resgatar a criatividade, a humanidade,
os valores e os princípios que deveriam ser presentes em cada indivíduo.
Até aqui o que se viu foi que “As pessoas educam para a competição e esse
é o princípio de qualquer guerra. Quando educarmos para cooperarmos e sermos
solidários uns com os outros, nesse dia estaremos a educar para a paz” (Maria
Montessori).
Então, é muito bom perceber que,
finalmente, estamos nos aproximando de uma compreensão na qual “Os educadores, antes de serem especialistas
em ferramentas do saber, deveriam ser especialistas em amor: interpretes de
sonhos”; “Pois ser mestre é isso:
ensinar a felicidade” (Rubem Alves). Mesmo que seja em um mundo tão hostil
e difícil como esse que temos diante dos olhos.
Assim, não nos esqueçamos, “Conseguir que as gerações futuras sejam mais felizes que a nossa será o maior prêmio a que se possa aspirar. Não haverá valor comparável ao cumprimento desta grande missão que consiste em preparar para a humanidade futura um mundo melhor” (Carlos Bernardo Gonzalez Pecotche). Feliz Dia do (a) Professor (a)!