terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Crônica do dia!


O pranto das águas



Por Alessandra Leles Rocha



Dentro da mais elementar “lei da ação e reação”, a beleza da vasta cobertura de gelo sobre o planeta vem década a década reduzindo a olhos vistos e, como bem sabemos, gelo derretido é água em abundância. Água que irá ao encontro de lagos, rios e oceanos, ampliando significativamente o volume destes. Água em estado líquido, cobrindo a imensidão territorial, é água também exposta à ação dos raios solares, das altas temperaturas, para se converter em vapor que se condensa e forma nuvens que irão devolvê-la em estado líquido novamente.

É! Então, distante de qualquer intenção de alarmismo, a verdade é que se nos últimos anos temos nos deparado com um volume de chuvas bem superior ao possível de suportar há uma explicação lógica e racional para isso. Se fenômenos como o El Niño ou La Niña interferem na distribuição pluviométrica ao redor do globo, a questão da alteração volumétrica dos recursos hídricos está sim, diretamente, relacionada às questões antrópicas.

Agindo como “senhor supremo” do limitado planeta, o ser humano na sua intempestiva ânsia de progresso e desenvolvimento colocou sua própria espécie em risco. A excessiva queima de combustíveis fósseis que agrava dia a dia o Efeito Estufa e eleva consideravelmente as temperaturas. A grande produção de radiação oriunda dos equipamentos eletro-eletrônicos que colaboram na formação das “ilhas de calor”, em parceria com a grande malha de asfalto, nos centros urbanos. O desmatamento de vastos ou pequenos espaços arbóreos, substituídos pela construção de vias de tráfego (ruas, avenidas, estradas) ou pela expansão agrícola, reduzindo de forma significativa a permeabilização do solo tornando-o “lavável” e incapaz de resistir ao impacto das terríveis torrentes. A população de sete bilhões de pessoas a serem atendidas nas suas necessidades básicas (moradia, educação, trabalho, lazer e segurança) depende do uso e ocupação do solo, o que, no entanto, não tem sido realizado de modo economicamente sustentável.

Por essas e tantas outras razões, ano velho e ano novo se confundem na repetição triste dos mesmos problemas. Desmoronamentos, enchentes, pessoas desabrigadas, mortos, feridos... Perdas humanas e materiais incalculáveis; bem como, o roto discurso de que “iremos agir, trabalhar para reconstruir”. Ora, reza o dito popular que “após a casa arrombada não adianta colocar tranca”!

A Terra é uma esfera coberta por dois terços de água líquida, mas enquanto houver água em estado sólido para derreter a tendência será o volume excedente extrapolar a capacidade dos receptores (rios, lagos e oceanos) e verter sobre as áreas terrestres. A previsão de regiões a serem avassaladoramente devastadas pelas águas é cada vez mais iminente e é por isso que a passividade diante das tragédias e calamidades não pode persistir. O movimento migratório dos “refugiados do clima” amplia-se nitidamente! Dentro e fora de cada estado ou país, milhares de pessoas estão perdendo a sua cidadania, vendo escapar pelas mãos os esforços de uma vida inteira, padecendo a tristeza de não poder velar e enterrar dignamente seus entes queridos e buscando, sabe-se onde, fiapos de força para reiniciar a construção.

Já diziam os antigos que “numa casa onde falta o pão, todo mundo grita e ninguém tem razão”, com a crise econômica que paira sobre as cabeças de países ricos, emergentes e pobres a limitação de recursos financeiros poderá agravar ainda mais o quadro de reconstrução de áreas atingidas pelas intempéries do clima. Enquanto o bom senso econômico pede “apertar os cintos”, evitar gastos, reduzir o inchaço da máquina administrativa estatal, a grande massa da população já percebe o rondar da inflação, da carestia, do desemprego, da cascata de juros a incidir sobre o cotidiano doméstico; e o desespero toma conta de quem se equilibra entre continuar o fluxo natural da vida e reconstruir a própria dignidade, que se foi na tragédia.

Ao contrário de paliativos, placebos sem resultado, se nada for feito a demanda poderá superar em muito a capacidade econômica para atender a crise ambiental. Mais do que as lágrimas que recaem dos céus é o pranto da terra que ecoará com mais dor e violência sobre o mundo; afinal, ainda que essa crise seja colocada em status prioritário à própria crise econômica estejamos certos de que mesmo assim poderemos não ter uma produção suficiente de alimentos e suprimentos (remédios, por exemplo) e espaço para abrigar os “refugiados” (respeitando as graves diferenças político-ideológicas que promovem a intolerância mundo afora; bem como, os valores sócio-culturais de cada nação).  


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