Quando
tudo parece desabar...
Por
Alessandra Leles Rocha
Se a Pandemia não nos matar a
todos, certamente, a ignorância assim o fará. Os sinais, quanto a esse caminho,
que se mostram no horizonte, são claríssimos. O Brasil está se desintegrando na
forma e no conteúdo como o conhecíamos até aqui. E não se trata de uma
desconstrução em nome de uma reconstrução melhor, mais vanguardista, mais
ajustada as visões do Terceiro Milênio; mas, de uma implosão que só deixa
escombros e uma paralisia apegada as reminiscências de um passado que não
existe há tempos.
Que jornais de grande circulação
e renome tenham abdicado do compromisso jornalístico com a nação é uma pena;
mas, posso dizer que não faz falta. O jornalismo mundial, também renomado,
cumpriu magistralmente esse papel e deu a visibilidade devida, como sempre faz,
a realidade do cotidiano de cada lugar. Portanto... a vida segue e a história
vai sendo contada, pela perspectiva daqueles que não se entregam a “cegueira”.
Aliás, esse tipo de silêncio é
curioso porque ele fala tão alto, que chama a atenção, até, dos mais
desavisados. Traz uma visibilidade de tamanha intensidade, para a notícia
relegada, que se estabelece uma discussão natural em torno do caso, perpetuando
o assunto por um tempo muito maior do que o desejado. Sem contar, os
precedentes especulativos que começam a circular em torno do episódio, os quais
fomentam ainda mais a imaginação popular.
Porém, esse breve recorte no campo
de metamorfoses abruptas do país, não altera o essencial que são os fatos. Isso
quer dizer que as reivindicações populares de ontem, de hoje ou de amanhã
estarão resguardadas na sua materialidade e integralidade, porque ultrapassam os
espaços dos veículos de imprensa e comunicação, diariamente, para serem
sentidos e compreendidos na própria perspectiva do cidadão.
Antes de ler, ainda que de
maneira superficial e tendenciosa, como acontece frequentemente na
contemporaneidade, as pessoas experimentam a realidade; o que as faz se
apropriar de um entendimento muito particular dos acontecimentos, mesmo que não
tenham uma consciência plena disso.
Elas entendem a carestia no
supermercado, na farmácia, no posto de gasolina, ... Elas se preocupam com o
desemprego e as baixas ofertas de trabalho formal no país. Elas enxergam o
aumento da mendicância nas ruas. Elas se apavoram com os riscos das violências
disseminadas dentro da sociedade. Elas se indignam com a falta e a
insuficiência de vacinas contra a COVID-19... De modo que o papel do jornalismo
se restringe a significância de fornecer eventuais elementos a mais para a
reflexão; mas, não significa que parta de suas palavras e ideias o insight das pessoas em relação ao
cotidiano.
E em meio a tudo isso, eis que me
deparei com uma notícia importantíssima, a qual amarra subliminarmente as
considerações feitas até aqui. “Ensino Médio não terá mais livros
exclusivos por disciplinas. História, geografia, sociologia e filosofia
foram diluídas dentro de um único livro didático” 1,
o que foi justificado como uma ação fundamentada nas diretrizes da Base
Nacional Comum Curricular do Novo Ensino Médio. Apenas, “Português, literatura e matemática foram os que menos sofreram
alterações em suas bases curriculares, e são as disciplinas consideradas
obrigatórias”.
Basta, então, uma leitura da
notícia para depurar intenções profundas sobre aquele “desmantelamento” do
país. A ideia não é só corte de gastos com livros didáticos. Não é só obter
controle ideológico sobre os assuntos. Não é só uma questão de ensinar pela via
interdisciplinar, como propõe as áreas de conhecimento – Ciências humanas e
suas Tecnologias; Ciências da Natureza e suas tecnologias; Linguagens, Códigos
e suas tecnologias; Matemática e suas tecnologias. É, simplesmente, fragilizar
a formação da identidade cidadã do aluno e controlar a sua capacidade de
análise crítico-reflexiva, por meio de conteúdos demasiadamente resumidos.
Em suma, o governo, e não o
cidadão, está decidindo o quê deve ser aprendido e como deve ser aprendido. Bem-vindos,
ao caminho de retrocesso da excelência. Um modo peculiar de frustrar as
potencialidades humanas, de minar as Ciências, as pesquisas e o desenvolvimento
científico e tecnológico, de motivar o surgimento de mão e obra desqualificada
e incapaz. Para isso não é preciso grandes investimentos, grandes
planejamentos, grandes comprometimentos sociais, grandes salários e benefícios.
Por mais impactante que possa
parecer, estamos diante do que escreveu Aldous Huxley, em 1932. “Um Estado totalitário verdadeiramente
eficiente seria aquele em que os chefes políticos de um Poder Executivo
todo-poderoso e seu exército de administradores controlassem uma população de
escravos que não tivessem de ser coagidos porque amariam a sua servidão. Fazer com
que eles a amem é a tarefa confiada, nos Estados totalitários de hoje, aos
ministérios de propaganda, diretores de jornais e professores” (Admirável Mundo novo).
Assim, não nos esqueçamos de que “Grande é a verdade, mas ainda maior, do ponto
de vista prático, é o silêncio em torno da verdade” (Admirável Mundo novo), porque
esse fia lentamente o infortúnio e a destruição. A beira do precipício é logo
ali.