Tensão
Por Alessandra Leles Rocha
Tensão. Talvez seja esta a melhor
palavra para definir o mundo neste momento. Aparentemente nenhuma novidade, se
uma recapitulação breve dos últimos bilhões de anos da história do planeta azul
for levada em consideração. Podemos até arriscar em dizer que “de uma explosão
viemos e por outra retornaremos ao pó”. Ou considerar a verdade de que, por
detrás da tensão há sempre uma intenção.
O fato é que o ar começa a
tornar-se mais e mais irrespirável, quando a tensão se agiganta sobre nós, os
pobres mortais. Tudo, porque no fundo temos a consciência de que para resolver
essa questão havemos de contar com uma força motriz chamada ser humano. Mas
essa força é complexa demais, ao ponto de render-se facilmente aos dualismos,
ou antagonismos da sua própria essência.
E são bilhões desses seres espalhados pelo planeta em uma árdua tarefa
de pautar-se pelo bom senso para alcançar um denominador comum que seja capaz
de satisfazê-los harmônica e pacificamente.
Ora, a razão não é unânime na sua
compreensão. Enxergar não significa reconhecer a mesma imagem. O exercício de
nossas faculdades cognitivas e intelectuais não se molda sempre pelos mesmos
princípios. Somos igualmente distintos na proporção de toda a nossa biologia.
Identidades cujo processo de identificação é um mistério muito além dos
meandros da explicação trivial. Daí, a tensão nos rodear, nos espreitar. O
desconhecido habita dentro e fora de nós.
O ser humano é o espelho da própria
Natureza. Alterna-se ao sabor dos ventos, da fartura e da escassez, da Lua sob
o comando das marés. Amigos ontem, inimigos amanhã; uniões providenciais,
inclusive, na fragilidade da sua tecedura. Aparências; uma para cada hora do
dia, para cada ocasião, para cada peça que se deseja mexer sobre o grande
tabuleiro do mundo. Como o raio que prenuncia o estrondo aterrorizante do
trovão, as palavras escondem na subjetividade de suas entrelinhas a força e o
poder do discurso. No fim das contas, homem e Natureza mostram que nada é
realmente o que parece ser.
Então, não há zona de conforto onde
se possa repousar em segurança e paz. A fina camada de gelo sob nossos pés pode
ruir a qualquer instante. Há muita tensão em todas as direções e sentidos. Cada
um busca abrigo sob a verdade que melhor lhe cabe; é por isso, que se olhada
bem de perto, a verdade nunca agrega com perfeição todos os seus retalhos, numa
estética sem lá muita beleza. E nesse
processo de estranho e humano individualismo, onde os egos dos umbigos se
elevam estratosfericamente, a tensão atinge o seu clímax.
O mundo é a própria sociedade e se
esta está tão ensimesmada por suas verdades, as tensões são inevitáveis. Sinto
como se fosse um vasto campo arenoso onde bilhões de cabeças estivessem
enterradas, tal qual um bando de avestruzes; com a diferença de que ao
contrário das aves, os humanos fazem isso por opção. Não, não é a dor, nem o
sofrimento, nem a tragédia, nem quaisquer outros fatos terríveis que são
realmente capazes de transformar os seres humanos em estopins de extermínio das
tensões. Pode ser que para alguns sim; mas, na medida em que não abrangem a
totalidade, o resultado final fica sempre a desejar, sempre um rastilho de
tensão pairando no ar.
Tensões de grande relevância ou de
absurda irrelevância. Tensões arbitrárias. Tensões egoístas. Tensões repletas
de ignorância. Tensões... Assim, entre todas elas tentamos viver. Em busca de
uma felicidade (que nunca chega). De um amanhã regado por ousada novidade, que
teima em povoar a imaginação. De uma fraternidade que não se restrinja a pertencer
a esse ou aquele grupo, nem ser assim ou assado. De um bem-estar que sirva para
todos e cada um. Aí, frustrados quando o
céu se pinta de negro com pequeninas luzes a brilhar, mais uma vez sem nada
disso ter acontecido, a gente fecha os olhos de novo e sonha para que o amanhã,
quem sabe distraído em ato falho, erre a profecia e faça tudo diferente.